O ritual do silêncio na era dos tiroteios em massa

O minuto de silêncio para lembrar vítimas de massacres como o de Las Vegas só favorece a continuidade das condições políticas que possibilitaram as mortes.

O ritual do silêncio na era dos tiroteios em massa

No dia 1 de outubro, Stephen Paddock se entrincheirou em um quarto de hotel em Las Vegas com duas dezenas de armas e abriu fogo sobre um festival de música country, que acontecia 30 andares abaixo, matando mais de 50 pessoas e ferindo centenas de outras. O termo técnico para esse tipo de matança, tiroteio em massa (ou mass shooting, em inglês), não tem uma definição universal. Consequentemente, registros formais apontam que esse tipo de acontecimento pode ocorrer de algumas dezenas de vezes por ano a uma vez por dia.

No fim de 2015, depois que 14 pessoas foram assassinadas a tiros no Inland Regional Center em San Bernardino (Califórnia), veículos de mídia começaram a falar em uma “era dos tiroteios em massa” nos Estados Unidos. Toda era tem suas tradições, e esta não é diferente. O “minuto de silêncio” observado por autoridades a cada massacre pode até ter origem em práticas religiosas mais antigas, mas tem uma função totalmente contemporânea. Imbui um fenômeno terreno e empiricamente comprovável de significado cósmico, isentando assim autoridades de enfrentar publicamente esse tipo de problema. Afinal, não há como impedir um ato divino.

O minuto de silêncio é sintomático não só daquilo que não entendemos em relação à violência armada — em parte porque o Congresso americano pressionou os centros para controle e prevenção de doenças (Centers for Disease Control and Prevention) a tirar recursos de todas as pesquisas sobre o tema há 20 anos –, mas também do que entendemos e não queremos reconhecer: atiradores suicidas tiram mais de 20 mil vidas nos EUA por ano; mulheres americanas têm 11 vezes mais chances de morrer por arma de fogo do que cidadãs de outros países desenvolvidos; homens negros representam 6% da população dos EUA, mas metade das vítimas de homicídios por arma de fogo.

Para combater esse fenômeno, seria necessário parar de ignorar hierarquias de gênero e de raça, assim como passar a repudiar o mito do herói pistoleiro, que promove o uso de armas letais nesse contexto já bastante fúnebre. É importante lembrar que os Estados Unidos têm tantos habitantes quanto armas de uso privado. Seria preciso ainda repudiar (e minar) a indústria altamente lucrativa responsável pela oferta dessas armas dentro de um país que clama por elas.

As autoridades que invocam o minuto de silêncio podem até insistir que é cedo demais para politizar a tragédia. Mas o silêncio para lembrar as vítimas não vai impedir que as mortes sejam maculadas pela política. Pelo contrário, só garante que as condições políticas que possibilitaram tais mortes continuem e façam novas vítimas.

Vídeo por Moiz Syed. Texto por John Thomason. Tradução por Carla Camargo Fanha.

2026 já começou, e as elites querem o caos.

A responsabilização dos golpistas aqui no Brasil foi elogiada no mundo todo como exemplo de defesa à Democracia.

Enquanto isso, a grande mídia bancada pelos mesmos financiadores do golpe tenta espalhar o caos e vender a pauta da anistia, juntamente com Tarcísio, Nikolas Ferreira, Hugo Motta e os engravatados da Faria Lima.

Aqui no Intercept, seguimos expondo os acordos ocultos do Congresso, as articulações dos aliados da família Bolsonaro com os EUA e o envolvimento das big techs nos ataques de Trump ao Brasil.

Os bastidores mostram: as próximas eleições prometem se tornar um novo ensaio golpista — investigar é a única opção!

Só conseguimos bater de frente com essa turma graças aos nossos membros, pessoas que doam em média R$ 35 todos os meses e fazem nosso jornalismo acontecer. Você será uma delas?

Torne-se um doador do Intercept Brasil hoje mesmo e faça parte de uma comunidade que não só informa, mas transforma.

DOE AGORA

Conteúdo relacionado

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar