Por causa das dificuldades financeiras, comum nas periferias, Ebony já foi muitas coisas. Ainda na infância, foi explicadora – ensinava o que aprendeu na escola para crianças ainda menores – e vendeu roupas na feira com os pais. Também foi trancista, e atendia a domicílio no Rio de Janeiro. Hoje, aos 22, Ebony é rapper e representante da forte cena trap no Brasil.
Criada na baixada fluminense, em uma região que se transformou de área rural em periferia, Ebony sofreu preconceitos sociais antes do racismo, que chegou quando começou a frequentar lugares como a zona sul da capital fluminense. Em etapas, ela conta, foi se entendendo enquanto mulher, pobre, negra e artista. “Hoje em dia olham para mim e, pelo fator social – o celular que eu tenho, como eu estou vestida, como eu falo, como eu me porto –, causa uma confusão nas pessoas. Eles não me colocam no lugar de ‘uma neguinha’ mais”.
No passado, Ebony já foi “bolsomito” – o que fala com pesar. Talvez por isso, entende quem é de periferia e votou no Bolsonaro – havia, em 2018, e ainda há, uma máquina de desinformação atuando em favor do candidato. Com discurso raso, mas focado em pontos importantes como corrupção e segurança pública, e o apoio das redes sociais, o papo de Bolsonaro tocou gente que não é fascista, como mães de favela. “Eu entendo o povo de massa, de base, que votou no Bolsonaro, porque eu não acho que venha do mesmo lugar que a galera da Barra da Tijuca que vota no Bolsonaro. As intenções do voto deles são diferentes”, acredita a cantora.
Para Ebony, falta representatividade para a construção de uma mudança política no país. “Para ter uma mudança a gente precisa de pessoas negras, mulheres, LGBTs. A gente precisa colocar essas pessoas lá e entender porque elas não chegam lá. Ou porque, quando estão chegando, elas morrem”. E esse problema não se resolve apenas elegendo Lula como presidente. “Ele fez grandiosas coisas pelo povo trabalhador brasileiro, mas eu não acho que você está fazendo política se você não repensa o sistema carcerário, se você não repensa a guerra às drogas”, ela diz. “Se você não pensa nisso, você não está olhando para a favela”.
Ebony é a terceira entrevistada do PPRT, série de conversas sobre política, cidadania e arte do Intercept. As entrevistas serão publicadas ao longo do mês de setembro, sempre às quintas-feiras.
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