João Filho

Mensagens provam que clã Bolsonaro despreza Deus, a pátria e a própria família

Áudios e prints encontrados pela PF mostram hipocrisia e a disputa pelo trono do fascismo diante da morte política de Jair Bolsonaro.

Eduardo Bolsonaro, Silas Malafaia, Jair Bolsonaro e Tarcísio de Freitas participaram juntos de manifestação bolsonarista, em São Paulo, no dia 7 de setembro de 2024 (Foto: Bruno Santos/ Folhapress)

“Deus, Pátria e Família” é um lema que atravessou gerações do fascismo brasileiro. Do integralismo ao bolsonarismo, todos a usaram como uma peça de marketing para dourar suas ideologias podres. Os diálogos encontrados pela Polícia Federal no celular de Jair Bolsonaro trouxeram à superfície a hipocrisia desses homens de bem que, de tempos em tempos, atormentam a democracia. 

Não que seja uma novidade, mas é que agora temos áudios e prints que vão deixar registrado de forma inequívoca a hipocrisia dessa gente. O que se viu nas conversas entre Bolsonaro, seu filho Eduardo e seu pastor Silas Malafaia foram violentos ataques contra Deus, a pátria e a família. 

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Malafaia tem linguajar de bicheiro e fala com seus fiéis como quem fala com a sua quadrilha. “Arrombado”, “babaca”, “merda” e “cacete” foram alguns dos termos que esse homem de Deus usou para se referir, aos berros, a Eduardo Bolsonaro em uma conversa com o ex-presidente. 

O pastor chega a contar que mandou um áudio para Eduardo com a seguinte ameaça: “a próxima que você fizer isso, eu gravo um vídeo e te arrebento”. Malafaia participou ativamente dos planos bolsonaristas para coagir membros do Legislativo e do Judiciário. 

Em nenhum momento dos diálogos se viu uma palavra de benção, um conselho ou algum gesto que se espera de um líder espiritual. Só se viu esporros, ameaças, palavrões, gritaria, ódio. Malafaia sente-se à vontade para esculhambar Eduardo Bolsonaro com seu pai porque se vê, com razão, como uma liderança do bolsonarismo. Apesar de não ter mandato, o pastor organizou e financiou muitas manifestações golpistas. 

Eduardo Bolsonaro, Silas Malafaia, Jair Bolsonaro e Tarcísio de Freitas participaram juntos de manifestação bolsonarista, em São Paulo, no dia 7 de setembro de 2024 (Foto: Bruno Santos/ Folhapress)
Eduardo Bolsonaro, Silas Malafaia, Jair Bolsonaro e Tarcísio de Freitas subiram juntos em caminhão durante manifestação, em São Paulo, no dia 7 de setembro de 2024 (Foto: Bruno Santos/ Folhapress)

Bolsonaro morreu politicamente e há uma disputa de poder pelo trono do fascismo. Malafaia pode não ter pretensões políticas partidárias, mas quer continuar influente dentro desse grupo. Enlouquecido por virar alvo da PF, o pastor agora se diz vítima de perseguição religiosa

Mais uma vez, usa-se a bíblia como escudo moral para se cometer as maiores barbaridades. Malafaia foi indiciado não por ser evangélico, mas por talvez ser um criminoso que se juntou a outros investigados para articular um esquema de coação de autoridades brasileiras. Vejamos o que o Deus de Malafaia está preparando para ele.   

A hipocrisia patriótica dessa gente está no mesmo nível da religiosa. Nos áudios, fica claro que o núcleo bolsonarista trabalha com um só objetivo: livrar Bolsonaro da cadeia através da pressão política e econômica de Donald Trump contra o Brasil. 

Não se viu nos diálogos alguém temeroso com os danos à economia brasileira. Nenhum dos valorosos patriotas fez qualquer objeção sobre condicionar às sanções econômicas dos EUA à anistia de Bolsonaro. Nada disso. Ao contrário, eles se mostraram dispostos a ferrar o país para atingir seus objetivos.

Em nenhum momento demonstrou-se alguma preocupação com os militantes golpistas condenados no 8 de Janeiro. Essa solidariedade só existe em público. No escurinho do WhatsApp, Eduardo Bolsonaro diz para o pai que Trump não ajudaria mais caso fosse aprovada a “anistia light” — aquela que pouparia apenas as “velhinhas de bíblia na mão”.

Segundo relatório da PF, “a real intenção dos investigados não seria uma anistia para os condenados pelos atos golpistas realizados no dia 08 de janeiro de 2023, mas sim, interesses pessoais, no sentido de obter uma condição de impunidade de Jair Bolsonaro”. Não há margem para qualquer interpretação diferente dessa. As conversas são claras e diretas. 

Além do desprezo por Deus e pela pátria, os áudios mostram que os Bolsonaros não têm respeito pela família. As conversas confirmam o que todos já sabiam: há uma disputa política interna entre pai e filhos. Os laços afetivos ali são frágeis e estão condicionados aos objetivos políticos de cada um. 

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Bolsonaro enfiou a família inteira na política e criou um gigantesco esquema de rachadinhas. Só uma ex-mulher de Bolsonaro levou cunhada, primo e irmãos para se lambuzar com dinheiro público. Nem preciso falar do senador Flávio Bolsonaro, que encheu o gabinete com a parentes de chefe de milícia e criou mais um esquema de rachadinha

A família Bolsonaro se uniu para roubar os cofres públicos e se manteve unida enquanto os interesses de cada um convergiam. Eles se protegem enquanto grupo político, não enquanto família. 

As conversas entre Eduardo e Jair mostram uma relação sem respeito e sem afeto. É normal que pai e filho que trabalham juntos eventualmente discutam, mas o que se viu no diálogo foi um nível de desrespeito inaceitável para qualquer família, ainda mais uma que prega os bons valores da tradicional família brasileira. 

“VTNC, SEU INGRATO DO CARALH*”, escreveu Eduardo para o pai depois de ser chamado de imaturo por ele em uma entrevista. Em público, o deputado grava vídeos chorando de tanta saudade do pai, no seu exílio de mentirinha. A hipocrisia grita.

‘A família Bolsonaro é uma incubadora de tiranos’.

Esse tipo de ofensa entre integrantes da família Bolsonaro não é um caso isolado. Como esquecer da troca de mensagens de 2017, quando o então deputado Jair foi flagrado na Câmara conversando com Eduardo no WhatsApp: “Papel de filho da puta que você está fazendo comigo. Tens moral para falar do Renan [Bolsonaro]? Irresponsável”, escreveu.

Eduardo respondeu revelando o profundo desprezo que sente pelo irmão: “Quer me dar esporro, tudo bem. Vacilo foi meu. Achei que a eleição só fosse semana que vem. Me comparar com o merda do seu filho? Calma lá”. 

A relação entre todos eles é tensa e está sempre cruzando a fronteira do desrespeito. O pai não tem boa relação com os filhos. Os filhos não têm boa relação com Michelle e não têm uma boa relação entre si. Não há afeto. Só ódio, interesse financeiro e político. 

A família Bolsonaro é uma incubadora de tiranos, e o autoritarismo é o motor das relações familiares. Quando Jair Bolsonaro morrer, a briga interna para assumir a liderança política da família será feia. Uma autofagia a céu aberto.

Além do desprezo por Deus, pela pátria e pela família, os diálogos encontrados no telefone de Bolsonaro confirmam integralmente todas as suspeitas da PF. Está mais do que comprovado que o núcleo bolsonarista agiu para coagir a justiça e para conseguir uma anistia apenas para Bolsonaro. 

Se eles já estavam enrolados com a justiça, agora a coisa desandou – principalmente Jair Bolsonaro, que, se condenado no novo inquérito, poderá pegar mais 12 anos de cadeia. Somando as penas máximas de outros crimes em que está implicado, pode chegar a até 55 anos. Haverá tempo de sobra para pedir perdão para Deus por tanta hipocrisia.

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