Brasília - Após a conclusão da leitura do parecer do relator do projeto da reforma trabalhista, deputados de partidos de oposição ao governo retomaram a obstrução aos trabalhos no plenário (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Apoiada pela grande imprensa, reforma trabalhista reduzirá o poder do trabalhador

Governo e grande mídia douram a reforma trabalhista e negam voz aos trabalhadores.

Brasília - Após a conclusão da leitura do parecer do relator do projeto da reforma trabalhista, deputados de partidos de oposição ao governo retomaram a obstrução aos trabalhos no plenário (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Depois de viajar pelo mundo ostentando apoio maciço do Congresso e dizendo fazer parte de um governo semi-parlamentarista, Temer tem visto sua base parlamentar derreter e ensaiar largá-lo ferido na estrada. O presidente é descartável e seu eventual sucessor, Rodrigo Maia, pode muito bem comandar uma das grandes missões patrocinada pela grande mídia e pelo alto empresariado: a reforma trabalhista.

Com a popularidade batendo nos calcanhares e a lama ultrapassando o pescoço, Temer passou a ser um empecilho para os que têm pressa em aprovar uma reforma que também não conta com o apoio da população. Além das pesquisas indicarem que a maioria é contra, o Senado abriu uma consulta pública para saber se o os brasileiros aprovam a alteração da CLT. O resultado até aqui é avassalador: 15 mil são a favor, enquanto quase 170 mil são contra. Mas a falta de apoio popular nunca será um problema para quem destituiu uma presidenta eleita e implantou um plano de governo rejeitado nas urnas. O compromisso da turma do Grande Acordo Nacional é com os setores que patrocinaram o impeachment.

O compromisso da turma do Grande Acordo Nacional é com os setores que patrocinaram o impeachment.
  

Vendida como uma modernização do trabalho e a única solução para o aumento da oferta de empregos, a reforma foi desenhada unicamente para atender aos interesses dos empresários. Em vez de buscar maior equilíbrio nas relações de poder entre patrão e funcionário, a mudança irá enfraquecer ainda mais a ponta fraca da corda. Apesar de ser uma reforma que altera profundamente as relações de trabalho no país, nenhuma entidade representativa dos trabalhadores participou da elaboração das propostas, o que é inconcebível em um país que se pretende democrático. Boa parte delas foram redigidas por lobistas de bancos, indústrias e transportes.

Uma das principais justificativas para dar força de lei aos acordos diretos entre patrões e funcionários seria o fato do “Brasil ser campeão mundial de ações trabalhistas”. A complexidade da atual legislação trabalhista levaria muita gente a encontrar brechas para processar o empregador. A liderança do Brasil nesse campeonato mundial fictício já esteve no relatório da proposta de reforma trabalhista da Câmara, foi notícia na Band, na Globo, na Record, no Estadão. Acontece que essa é uma falácia que acabou virando senso comum de tanto que se martelou na cabeça dos brasileiros ao longo dos últimos anos. Em recente artigo para o Jota, o especialista em Direito do Trabalho, Cássio Casagrande, desmontou ponto a ponto a cantilena e demonstrou que ela não possui base alguma na realidade. Casagrande se debruça também sobre uma frase proferida em uma conferência em Londres pelo ministro do STF, Luis Roberto Barroso: “A gente na vida tem que trabalhar com fatos e não com escolhas ideológicas prévias. O Brasil, sozinho, tem 98% das ações trabalhistas do mundo.” O número é irreal, não está baseado em nenhum estudo ou pesquisa e, ironicamente, parece ser fruto de uma escolha ideológica prévia do ministro.

No mês passado, um estudo da Repórter Brasil revelou o apoio maciço das grandes empresas de comunicação à reforma trabalhista. A conclusão é de que há pouquíssimo espaço ou mesmo nenhum para opiniões contrárias:

“O Jornal da Record foi o menos crítico à proposta apresentada pelo governo, com 100% das reportagens favoráveis. O Globo foi o segundo mais alinhado, com 88% do conteúdo suportando o que defende o Palácio do Planalto. Em seguida, aparecem o Jornal Nacional (77%) e O Estado de S.Paulo (68%). A Folha de S.Paulo (42%) destoou dos outros veículos, já que criticou a proposta em mais de metade dos seus textos.”

O fato do Jornal da Record não disponibilizar sequer um segundo para as críticas à reforma não chega a ser motivo para espanto, já que a empresa é da propriedade do empresário-pastor Edir Macedo, o controlador oculto do PRB, um importante partido da base governista.

O SBT não entrou na análise da Repórter Brasil, mas vem cumprindo com louvor o seu papel de cão de guarda das elites. Logo no dia seguinte a um encontro entre Temer e o empresário Sílvio Santos, a emissora usou da concessão pública para promover as reformas, como se elas fossem um produto Jequiti. Com inserções inesperadas no meio da programação, a empresa veiculou mensagens terroristas como: “Você sabe que, se não for feita a Reforma Trabalhista, você pode deixar de receber o seu salário?”

ss-1499606187

(Foto: Reprodução/Instagram)

Mas o dono do Baú foi com muita sede ao pote ao utilizar uma concessão pública para defender seus próprios interesses. O SBT foi alvo de um inquérito do Ministério Público do Trabalho que constatou que a emissora estava exibindo “chamadas publicitárias com informações duvidosas sobre o tema”. A procuradora Renata Coelho, responsável pelo inquérito, afirma que “trata-se de propaganda possivelmente sem base fática ou documental, que não exprimiria opinião, mas sim afirmativa que sem a aprovação das reformas o país estará quebrado e o trabalhador ficaria sem salário”. A empresa assinou um termo de compromisso com MPT prometendo veicular mensagens educativas sobre a reforma.

Os colunistões mais prestigiados pelas empresas de comunicação também são unânimes na importância da reforma e repetem incansavelmente que essa é a única saída para a crise econômica. Merval, Sardenberg, Miriam Leitão e Reinaldo Azevedo puxam a fila e ajudam a empurrar goela abaixo da população uma narrativa única.

Por mais que a expressão cause horror, o que vemos é a luta de classes na sua essência. O topo da pirâmide, na ânsia de não querer perder seus privilégios com a crise, coloca todas suas armas na mesa, enquanto a base resiste para não perder direitos conquistados a duras penas. Nesse conflito desigual de interesses, reforma trabalhista tirará o estilingue de Davi e entregará uma metralhadora para Golias. Mas a realidade é dura e o desfecho certamente não será bíblico.

A VIRADA COMEÇA AGORA!

A virada começa agora!
Todo fim de ano traz metas pessoais. Mas 2026 exige algo maior: metas políticas — e ação imediata.
Qual virada você quer para o Brasil?
A que entrega ainda mais poder à direita para sabotar o povo — ou a virada em que eles ficam longe do Congresso, do Senado e da Presidência?
Eles já estão se movendo: o centrão distribui emendas para comprar apoio, as igrejas fecham pactos estratégicos, as big techs moldam os algoritmos para favorecer seus aliados, e PL, Republicanos e União Brasil preparam o novo candidato queridinho das elites.
E tudo isso fica fora dos holofotes da grande mídia, que faz propaganda fantasiada de jornalismo — sempre servindo a quem tem dinheiro e poder.
Aqui não. No Intercept Brasil, suas metas de ano novo para o país também são as nossas. Estamos na linha de frente para expor esses projetos de poder e impedir que 2026 seja o ano da extrema direita.
Mas essa virada depende da mobilização de todos.
Para continuar investigando — e desmontando — cada etapa dessa articulação silenciosa, precisamos da sua doação.
E ajude a conquistar as metas que o Brasil precisa.
Fortalecer o jornalismo independente que não deve nada a políticos, igrejas ou empresas é a única forma de virarmos o jogo.

Doe Agora

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar