Demonstrators bange saucepans during a protest against Brazilian President Dilma Rousseff and the ruling Workers Party (PT) at Liberty Square in Belo Horizonte, Brazil on March 13, 2016. Protesters, many draped in the Brazilian national flag, poured into the streets  on Sunday at the start of mass demonstrations seeking to bring down President Dilma Rousseff. AFP PHOTO / Douglas MAGNO / AFP / Douglas Magno        (Photo credit should read DOUGLAS MAGNO/AFP/Getty Images)

O silêncio das panelas

Despudor, bundalelê e impunidade sem limites encontram ruas vazias.

Demonstrators bange saucepans during a protest against Brazilian President Dilma Rousseff and the ruling Workers Party (PT) at Liberty Square in Belo Horizonte, Brazil on March 13, 2016. Protesters, many draped in the Brazilian national flag, poured into the streets  on Sunday at the start of mass demonstrations seeking to bring down President Dilma Rousseff. AFP PHOTO / Douglas MAGNO / AFP / Douglas Magno        (Photo credit should read DOUGLAS MAGNO/AFP/Getty Images)

Paneleiros, por onde andam? Seu cúmplice silêncio não é de hoje, mas depois que as tratativas evocadas por Romero Jucá para melar a Lava Jato naquele célebre telefonema começaram a materializar-se como um joguinho perfeito de Tetris, onde tudo se encaixa no timing exato – até a morte do relator do processo no supremo –, era de se esperar o retorno da sua fúria estridente.

Ainda mais com o douto (só que ao contrário) Alexandre de Moraes no STF, uma nomeação cujas nefastas consequências ultrapassam simplesmente pôr em risco o resultado da operação tão querida pelo brasileiro “de bem”. Ainda mais com Edison Lobão, investigado em dois inquéritos da Lava Jato, presidindo a sabatina de Moraes no Senado. Ainda mais com a tentativa de foro privilegiado para Moreira Franco – sem direito a chilique da grande imprensa e áudio vazado por Sérgio Moro, como quando da quase nomeação de Lula na Casa Civil, em março passado, supostamente pelo mesmo motivo. Ainda mais com a ventilada nomeação de um Ministro da Justiça crítico à Lava Jato. Ainda mais…

A lista de motivos para que os amarelinhos voltassem a marchar pelas ruas contra a corrupção só faz crescer. O Vem pra Rua “discute convocar atos”, mas sabemos que o brasileiro “de bem” não sabe pensar sozinho e costuma apenas sair à rua quando a Globonews ajuda na chamada. Sua indignação seletiva é um traço de falta de caráter. Ou isso, ou não foi exatamente contra a corrupção que bateram panelas no ano passado.

Voltemos a fita: a oposição derrubou uma presidente eleita, cuja única e exclusiva qualidade para o cargo era justamente a de ser honesta – ainda que num partido manchado pela corrupção, como todos os outros –, para tentar “estancar a sangria” da operação conduzida por Sérgio Moro. O mesmo juiz, no meio do caminho, ofereceu vastas evidências de que poupava tucanos enquanto seus procuradores investiam na tese delirante de que Lula, montado em pedalinhos de ouro, seria o solitário líder máximo da “organização criminosa”, com grande estardalhaço na imprensa. Ao contrário do que acontece quando Eduardo Cunha coloca Temer no núcleo do Petrolão.

A cena é complexa, algo sai de controle todos os dias e os atores estão errados pelos motivos certos – e vice-versa. Por isso, a dicotomia empurrada pela grande imprensa goela abaixo dos brasileiros – de bem ou não – é insuficiente para completar o quadro. Mas bastante útil para convocá-los para a rua quando conveniente. Não é exatamente uma novidade.

Há pouco mais de um século, Lima Barreto publicou “Memórias do escrivão Isaías Caminha”, seu primeiro romance. Desde então, o retrato da corrupta elite e corrupta imprensa carioca presente no livro merece poucos retoques. Lendo o Lima, a impressão que temos é a de que o tempo não passa no Rio de Janeiro – e no Brasil.

“Isaías Caminha” é baseado nas suas experiências no Correio da Manhã. No entanto, como trata-se de um “roman à clef”, onde todos os nomes são trocados, o escritor profeticamente chama o jornal onde seu narrador auto-ficcional trabalha de O Globo. Sobre as revoltas que incendiaram as ruas na primeira década do século passado, ele escreve:

“As vociferações da minha gazeta tinham produzido o necessário resultado. Aquele repetir diário em longos artigos solenes de que o governo era desonesto e desejava oprimir o povo, que aquele projeto visava enriquecer um sindicato de fabricantes de calçado, que atentava contra a liberdade individual, que se devia correr a chicote tais administradores, tinha-se incrustado nos espíritos e a irritação alastrava com a violência de uma epidemia.”

Em condições normais de temperatura e pressão no Brasil o povo só vai pra rua se Sinhô mandar. Pelo que lemos pelos seus arautos e ideólogos, Sinhô ainda não parece muito animado nesse momento. Mas dá sinais de mudança. Esperemos.

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