A Polícia Federal desbaratinou mais um escândalo no mercado financeiro. A operação Compliance Zero, deflagrada nesta semana, investigou a emissão de títulos de créditos falsos por instituições financeiras que integram o sistema financeiro. O grande beneficiário do esquema era o Banco Master, que oferecia a seus clientes investimento em renda fixa, o CDB, a valores muito abaixo do valor de mercado.
Foram cumpridos sete mandados de prisão e 25 de busca e apreensão em todo o Brasil. A Polícia Federal prende os milionários e, talvez, esse seja o principal motivo pelo qual Guilherme Derrite, o Centrão e o bolsonarismo desejarem tanto excluí-la das investigações contra o crime organizado no PL Antifacção.
Não foi uma novidade. Até os sapatênis que desfilam na Faria Lima conheciam as pilantragens de Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, que foi preso enquanto se preparava para fugir no seu jatinho particular. Tudo indica que o banqueiro, muito bem relacionado no mundo político, preparou a fuga ao receber a informação de que seria preso.
O cheiro de trambique que vinha do Banco Master sempre foi forte, mas Vorcaro conseguiu ir longe graças ao grande arco de alianças políticas que ele construiu ao longo dos anos.

Um lobby poderosíssimo na defesa dos seus interesses foi instalado em Brasília, permitindo que o banqueiro tivesse uma vida de luxo e ostentação financiada pela trambicagem. A pessoas próximas, ele confessava ter feito “fortes amigos” na capital federal e dizia que, sem o apoio de poderosos, não estaria no lugar aonde chegou.
Muito se falou que Vorcaro mantinha relações com integrantes dos três poderes e de espectros ideológicos variados. É verdade. Esse é mais um caso que revela a intensa promiscuidade entre a classe política e jurídica com banqueiros. Mas é importante diferenciar quais dessas conexões atuaram diretamente para proteger o trambique.
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, fez parte do comitê consultivo estratégico do Master. Ele foi contratado pelo banco assim que deixou o STF e, em seguida, deixou o cargo para integrar o governo. Me parece algo eticamente questionável por si só, mas foi a PF, subordinada a ele, que colocou o banqueiro na cadeia.
O escritório de Viviane Barci de Moraes, mulher de Alexandre de Moraes, também foi contratado por Vorcaro. Apesar de não haver ilegalidade na contratação, não me parece adequada a aproximação de um parente de ministro do Supremo com uma figura reconhecidamente controversa.
O sócio de Vorcaro é amigo íntimo do líder do governo no Senado, Jaques Wagner, do PT da Bahia. Nada disso cheira bem, é verdade, mas, até aqui, não há indícios que essas relações tenham facilitado a vida criminosa de Vorcaro.
Parte da imprensa está louquinha para ressaltar os laços, digamos, mais governistas do banqueiro. Mas o fato concreto é que o lobby político em defesa dos interesses espúrios de Vorcaro mora no Centrão e na extrema direita.
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A tropa de choque do banqueiro em Brasília tem nome e sobrenome: Antonio Rueda, presidente do União Brasil; Ciro Nogueira, presidente do PP; e Ibaneis Rocha, governador do Distrito Federal, do MDB. Essa trinca se mobilizou de maneira intensa em defesa dos interesses do Banco Master em Brasília.
Em abril deste ano, Ciro Nogueira atuou fortemente nos bastidores para barrar uma CPMI que investigaria o Banco Master. À época, o senador Jorge Kajuru, do PSB de Goiás, declarou: “O lobby contra a CPI está pesado nos bastidores. Boa parte dos senadores não vai se vender, mas evidentemente que tem gente que tem preço”.
Apesar de haver assinaturas suficientes, o ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro conseguiu evitar a CPMI que investigaria os negócios do seu banqueiro. E essa não foi a primeira vez que Ciro Nogueira atuou para ocultar os trambiques de Vorcaro.
No ano passado, ele tentou malandramente fazer uma alteração na PEC que garante a autonomia financeira do Banco Central, que ficou conhecida como “emenda Master”. O senador buscou aumentar de R$ 250 mil para R$ 1 milhão a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito, o FGC, para as aplicações financeiras como o CDB, justamente o principal produto do banco de Vorcaro.
A ideia, que daria passe-livre para o trambique, acabou sendo rejeitada pelo relator da PEC na Comissão de Constituição e Justiça, o senador Plínio Valério, do PSDB do Amazonas.
Essa CPMI seria aberta para investigar a escandalosa compra de ações do Master pelo BRB, o banco estatal de Brasília. O negócio foi feito sob as bênçãos de Rueda, Ciro e Ibaneis. Segundo as investigações da PF, a compra das ações do Master pelo BRB foi feita por “pura camaradagem” como “tentativa de abafar a fiscalização” feita pelo Banco Central.
‘Trata-se da velha fórmula do neoliberalismo: privatiza-se o lucro e socializa-se os riscos’.
O negócio de cerca de R$ 2 bilhões foi defendido publicamente por Ibaneis e rapidamente autorizado por todos os deputados da base do governador. Na época, Ibaneis declarou que a compra do banco ajudaria o Distrito Federal a investir em mais obras: “Isto tem um significado muito grande para a população do Distrito Federal, porque nós, como acionistas majoritários de um banco público, passamos a ter mais dividendos para poder investir nas obras que são necessárias na cidade”.
Sob alertas do órgãos de controle, mas com o intenso apoio de Ciro Nogueira e Rueda, o governador do DF colocou um banco público para salvar um banco privado rumo à falência. Trata-se da velha fórmula do neoliberalismo: privatiza-se o lucro e socializa-se os riscos.
As investigações apontam também que Vorcaro recebeu investimentos bilionários de um fundo suspeito de ligação com o PCC. Coincidência ou não, há fortes suspeitas de que Rueda e Ciro Nogueira se relacionam com empresários ligados à facção.
O aprofundamento das investigações sobre o escândalo do Master é promissor e está deixando muita gente apavorada, principalmente parte da turma que queria enfraquecer o papel da Polícia Federal no PL Antifacção do Derrite.
Aliás, nunca é demais lembrar: Rueda e Nogueira são os principais articuladores da candidatura presidencial de Tarcísio, o homem que indicou Derrite para cuidar do PL Antifacção. Nunca foi tão fácil ligar os pontos.
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