Tarcísio de Freitas já está em campanha pelos votos evangélicos

Tarcísio de Freitas já está em campanha pelos votos evangélicos

Em dobradinha com o prefeito Ricardo Nunes, que quer ser candidato ao Palácio dos Bandeirantes, governador paulista tem cortejado bispos e pastores e feito visitas constantes a templos evangélicos.

Tarcísio de Freitas já está em campanha pelos votos evangélicos

Com Jair Bolsonaro inelegível até 2030 e prestes a ser condenado no STF pela tentativa de golpe, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do Republicanos, se consolida como o candidato preferido do establishment. E sua campanha já começou. 

Oficialmente, Tarcísio despista sobre concorrer à Presidência. Sem confirmar se será candidato à reeleição ao governo paulista ou ao Planalto, ele evita melindrar Bolsonaro, que ainda sonha com uma improvável anistia política. Também não quer criar animosidades com eleitores bolsonaristas que poderiam ameaçar lhe negar o apoio durante a campanha.

Nos bastidores, no entanto, a candidatura à presidência vem se consolidando, com indicativos crescentes de apoio do mercado financeiro (leia-se Faria Lima), de empresários, fazendeiros e usineiros do interior paulista, da mídia hegemônica e de outros poderosos. E Tarcísio tem obtido uma sinalização favorável de aliados estratégicos como os dos presidentes nacionais do PL, Valdemar Costa Neto, e do PP, Ciro Nogueira.

O governador de São Paulo, que é católico, também tem construído uma aliança sólida com líderes evangélicos e o eleitorado majoritariamente conservador. Inclusive, tem cortejado bispos e pastores e feito visitas constantes a templos. “Deus é o Deus do impossível. (…) E fala pra gente: ‘faça o possível, o impossível deixa comigo que eu realizo”, disse Tarcísio, em um vídeo em sua conta no X com trechos de uma pregação, em junho deste ano.

Durante a Marcha para Jesus na capital paulista, no feriado de Corpus Christi, o governador de São Paulo chamou a atenção ao aparecer em cima de um caminhão enrolado em uma bandeira de Israel, depois de cantar um louvor evangélico ao lado da bispa Sonia Hernandes, da Igreja Renascer. 

Tarcísio estava acompanhado também do apóstolo Estevão Hernandez, marido de Sonia, e de outras lideranças como o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, do MDB, e o ministro do STF André Mendonça, que é evangélico, ligado à Igreja Presbiteriana.

Tarcísio de Freitas se enrolou em uma bandeira de Israel durante participação na 33ª Marcha para Jesus, em junho, na capital paulista (Foto: Roberto Sungi/Ato Press/Folhapress)
Tarcísio de Freitas se enrolou em uma bandeira de Israel durante participação na 33ª Marcha para Jesus, em junho, na capital paulista (Foto: Roberto Sungi/Ato Press/Folhapress)

Os fiéis gritavam o nome de Jesus empunhando a bandeira de Israel, também enaltecida pelo governador. Pelo gesto, Tarcísio foi criticado, entre outros, pelo ministro do Empreendedorismo, Márcio França, do PSB, que o acusou de “humilhar libaneses, sírios e árabes”. Representantes de comunidades árabes e palestinas também condenaram o ato de Tarcísio por apoiar um país acusado de genocídio contra a população palestina.

Os evangélicos cultuam Israel por considerar que o seu território está localizado em uma terra santa e lá ocorrerá, em breve, o retorno de Jesus. Há segmentos que entendem que o retorno dos judeus à terra prometida, a antiga Canaã, rebatizada como Palestina pelos romanos, seria fundamental para a reconstrução do reino de Israel, como uma condição para o retorno de Jesus Cristo e a salvação do mundo. Daí vem a adoração evangélica por Israel.

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Tarcísio, em campanha e de olho no eleitorado evangélico, abraça esse discurso. Com a intenção de agradar os evangélicos, o governador se envolveu em uma polêmica com  servidores da área de saúde e moradores da zona norte de São Paulo ao sancionar um projeto de lei do deputado estadual e pastor Oseias de Madureira, do PSD, que alterou o nome de um hospital da região, o Mandaqui, para Conjunto Hospitalar do Mandaqui Bispa Keila Campos Costa Ferreira.

A intenção é homenagear a bispa da Igreja Assembleia de Deus Madureira, esposa do bispo Samuel Ferreira, o líder da denominação, morta em fevereiro. Mas moradores do bairro e servidores foram contra  a mudança. Líderes de movimentos sociais divulgaram, inclusive, um manifesto público e um abaixo-assinado  encaminhado à Casa Civil do governo, protestando contra a medida.

Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, abraça Manoel Ferreira, bispo-primaz da Madureira e presidente vitalício da Convenção Nacional das Assembleias de Deus Madureira (Foto: Instagram AD Brás/ Reprodução)
Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, abraça Manoel Ferreira, bispo primaz da Assembleia de Deus Madureira (Foto: Instagram AD Brás/ Reprodução)

Tarcísio tem mantido encontros frequentes com o bispo Samuel Ferreira e seu pai, Manoel Ferreira, o bispo primaz da Assembleia de Deus Madureira. Samuel é um dos líderes evangélicos que tem como meta, em 2026, eleger o maior número possível de parlamentares para a sua igreja.

Nas visitas a Samuel e a Manoel Ferreira, Tarcísio tem ido, quase sempre, acompanhado do prefeito Ricardo Nunes, seu aliado político, que deseja concorrer ao Palácio dos Bandeirantes, caso o governador desista mesmo de tentar a reeleição e ingresse na disputa da Presidência. Os dois têm atuado em dobradinha percorrendo templos evangélicos, não só da Assembleia Madureira, mas também de outras denominações.

Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (à direita), prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (ao lado) e advogado-geral da União, Jorge Messias (ao centro) participaram de culto especial em celebração ao aniversário do Manoel e Samuel Ferreira, em junho (Foto: Instagram AD Brás/ Reprodução)
Tarcísio e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (ao lado do governador) participaram de culto especial na Assembleia de Deus Madureira, em junho (Foto: Instagram AD Brás/ Reprodução)

No início de junho, Tarcísio e Nunes estiveram na sede da Assembleia Madureira, no bairro do Brás, para celebrar o aniversário de Manoel e Samuel. Em fevereiro, os dois compareceram ao velório da bispa Keila Ferreira. Um mês depois, em março, Nunes, sem Tarcísio, participou de reunião deliberativa da Convenção da Assembleia Madureira, ao lado de Samuel Ferreira e do pastor Silas Malafaia.

Já em maio, Tarcísio e Nunes foram juntos à celebração de inauguração do novo templo da Igreja do Evangelho Pleno em Cristo, em Pirituba, na zona oeste de São Paulo, liderada pelo apóstolo Rodrigo Salgado e pela bispa Cristina Salgado. O governador e o prefeito estiveram no púlpito ao lado, também, do apóstolo Estevam Hernandes, da Renascer, e do vice-prefeito de São Paulo, coronel Ricardo Mello Araújo, do PL.

Tarcísio de Freitas e Ricardo Nunes participaram juntos da inauguração da nova sede Igreja do Evangelho Pleno em Cristo, em maio (Foto: Instagram/Reprodução)
Tarcísio de Freitas e Ricardo Nunes estiveram juntos na inauguração da nova sede Igreja do Evangelho Pleno em Cristo, em maio (Foto: Instagram/Reprodução)

No mesmo mês, a dupla visitou o apóstolo Valdemiro Santiago, da Mundial do Poder de Deus, na sede da igreja, no Brás. Em abril, Valdemiro havia ido ao encontro de Tarcísio para “orar por sua gestão”.

O religioso não vive um bom momento, mas é um firme aliado de Tarcísio. A Igreja Mundial, liderada pelo apóstolo, foi despejada de seu templo em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo, por decisão da justiça, em junho, após acumular uma dívida de R$ 4,1 milhões por não pagamento de aluguel aos proprietários do imóvel. Valdemiro e a Mundial respondem por dezenas de outras ações de despejo semelhantes em São Paulo e outros estados pelo mesmo motivo.

Valdemiro Santiago publicou foto em abril, com Tarcísio e disse que estava orando pelo seu governo (Foto: Instagram/Reprodução)
Valdemiro Santiago publicou foto em abril, com Tarcísio e disse que estava orando pelo seu governo (Foto: Instagram/Reprodução)

Depois de ter contas bancárias bloqueadas na Justiça, o apóstolo “abriu” uma nova igreja – na verdade, um novo CNPJ –, intitulada Igreja Mundial Mais que Vencedores, como o Intercept Brasil revelou em dezembro de 2022. Mas a nova denominação também passou a ser alvo de ações semelhantes. A reportagem mostrou que Valdemiro tinha bens ocultos, como uma mansão com 22 quartos em Ilhabela, no litoral norte de São Paulo. Somente as dívidas de IPTU atrasados do imóvel com a prefeitura local, à época, somavam R$ 2,7 milhões.

Mesmo com esse histórico, Valdemiro goza de prestígio com o governador Tarcísio, que fez elogios a ele nas redes sociais. Em um vídeo, postado no Instagram da Igreja Mundial em novembro do ano passado, o governador parabenizou o apóstolo pelo seu aniversário. Desejou saúde ao religioso, disse que ele seria vítima de perseguição e agradeceu a Valdemiro por suas “curas e milagres” e pelo o que ele “faz por nosso Estado de São Paulo e o nosso Brasil”.

O seu futuro está sendo decidido longe dos palanques.

Enquanto Nikolas, Gayers, Michelles e Damares ensaiam seus discursos, quem realmente move o jogo político atua nas sombras: bilionários, ruralistas e líderes religiosos que usam a fé como moeda de troca para retomar ao poder em 2026.

Essas articulações não ganham manchete na grande mídia. Mas o Intercept está lá, expondo as alianças entre religião, dinheiro e autoritarismo — com coragem, independência e provas.

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