Giovanni Rocco Neto é o novo secretário nacional de Apostas Esportivas, cargo estratégico do Ministério do Esporte, sob a gestão de André Fufuca, do PP. Ele terá um grande desafio para conciliar interesses no órgão recém-criado pelo governo Lula, do PT, para regular as bets.
Até assumir o cargo público, em agosto deste ano, ele foi o presidente da Associação em Defesa dos Jogos e Apostas, a Adeja. Durante o período à frente da entidade, fundada em 2022, Rocco foi um dos principais lobistas em favor das empresas de apostas brasileiras, as chamadas bets.
A escolha de Rocco chama a atenção, considerando que ele agora deve liderar a supervisão e investigação de manipulações nos resultados esportivos – um problema que impacta diretamente a imagem e a própria operação das empresas que ele defendeu.
Fontes ligadas ao setor afirmaram que a função de Rocco Neto é especificamente sensível para os planos das bets brasileiras, já que casas de apostas menores costumam ser usadas para escândalos de manipulação e lavagem de dinheiro.
Durante a tramitação da lei que regulamentou as apostas esportivas no Brasil no Congresso, Rocco era figurinha carimbada representando a Adeja. Ele foi expositor de uma audiência na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados reforçando o discurso das bets.
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Na ocasião, Rocco deixou evidente o setor específico que representava: as bets nacionais, de pequeno e médio porte, que temiam ser sufocadas por uma legislação mais pesada – mais fácil de ser cumprida por grandes empresas de apostas estrangeiras.
“Eu queria agradecer a oportunidade de expor o olhar dos pequenos e dos empresários brasileiros nesse processo. Mansur [na ocasião, assessor do Ministério da Fazenda], se não tiver inclusão dos pequenos e médios, a expectativa de receita não vai vir”, alertou.
“O apostador não vai para o site legal, ele vai ficar na ilegalidade. Isso já aconteceu no resto do mundo e precisamos olhar para isso. Precisamos dar a oportunidade para as pessoas que já investiram”, disse Rocco, evocando a necessidade de uma regulação mais permissiva.
‘O diálogo constante entre os agentes privados e a União é essencial para garantir que interesses de todos os envolvidos estejam representados.’
Durante a fala, ele afirmou que seu guru no tema era Magnho José, jornalista do portal BNL Data, especializado em jogos, loterias e apostas, e presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal, outra entidade que atua em prol das empresas de apostas brasileiras.
A forte relação com entidades e empresas de apostas e loterias esportivas do país também ficou expressa na celebração à nomeação de Rocco. A Associação Nacional de Jogos e Loterias, a ANJL, divulgou comunicado público ressaltando a relação do novo secretário com o setor privado.
“O diálogo constante entre os agentes privados e a União é essencial para garantir que interesses de todos os envolvidos estejam representados”, disse Plínio Jorge, presidente da ANJL, entidade que diz congregar empresas de jogos e loterias legais, ou “em vias de legalização no Brasil”.
Depois da publicação da reportagem, a ANJL entrou em contato com o Intercept e afirmou que “a relação da indústria de apostas com Rocco é eminentemente técnica e de diálogo e cooperação, assim como ocorre também com outros membros do governo federal”. A entidade afirmou que a nota celebrando a nomeação do secretário tinha um caráter “republicano”, e que não indica que Rocco seja um lobista do setor.
Em nota enviada ao Intercept, o Ministério do Esporte afirmou que todos os requisitos legais para nomeação de Rocco foram cumpridos. Mas não comentou sobre o histórico de Rooco nem eventuais conflitos de interesse no comando da pasta.
Associações defenderam bets brasileiras durante debate sobre regulação
As entidades de Rocco, Magnho José e Plínio Jorge atuaram como o “trio de ferro” do lobby das bets brasileiras durante a tramitação da lei aprovada no Congresso em 2023.
Enquanto as empresas nacionais, em maioria de pequeno e médio porte, reivindicavam menos regulação estatal, grupos estrangeiros atuaram por mais impedimentos à atuação de mais players no mercado – e também tinham interesses específicos nas regras sobre os quadros societários.
Com a lei aprovada no Congresso Nacional, as atenções do setor se voltaram ao governo federal, responsável pelas portarias de regulamentação do setor. E a gestão Lula não hesitou em escolher justamente Rocco para liderar a Secretaria de Apostas Esportivas.
Para cuidar das bets, além da pasta agora chefiada pelo lobista, o governo Lula ainda tem a Secretaria de Prêmios e Apostas no Ministério da Fazenda, sob o comando do advogado Regis Dudena, sem grande experiência ou feitos realizados no setor.
Enquanto o Ministério do Esporte se concentra no combate a fraudes e manipulações, a Fazenda tem funções de regulação econômica, fiscalização de tributos e combate à lavagem de dinheiro. As duas secretarias, segundo o governo, “atuarão de forma coordenada para garantir um ambiente de apostas esportivas ético e regulado”.
Atualização: 12 de novembro de 2024, 16h05
O texto foi atualizado para incluir posicionamento da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), enviado após a publicação da reportagem.
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