João Filho

A escalada violenta dos bolsoterroristas é fruto da conivência das forças de segurança

O famoso ‘Estado Democrático de Direita’ tem funcionado a pleno vapor no país, com ataques e depredações sem ação contundente do estado.

BRASÍLIA, DF, 12.12.2022 - PROTESTO-DF: Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) entram em confronto com a polícia e promovem depredação após confusão iniciada na sede da Polícia Federal, em Brasília, na noite desta segunda-feira; diversos ônibus e carros foram queimados. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)

A escalada violenta dos bolsoterroristas é fruto da conivência das forças de segurança

Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

No fim do mês passado, escrevi nesta coluna sobre a necessidade imperiosa de se punir os atos de terrorismo que começavam a tomar proporções perigosas. Naquele momento, os terroristas já haviam queimado ambulâncias, postos de pedágio, apedrejaram um caminhoneiro que furou um dos bloqueios e atiraram contra uma viatura policial. A bandidagem seguiu agindo sob o silêncio conivente de Jair Bolsonaro e protegidos pela impunidade.

Os golpistas já estão há quase 2 meses cometendo crimes na frente dos quartéis e nas estradas, sempre debaixo do nariz dos militares, que permanecem de braços cruzados. Como era claro que aconteceria, a impunidade fez com que a violência dos terroristas fosse escalando ainda mais. O ápice se deu na noite da última segunda-feira, após Lula ter sido diplomado como presidente da República. Brasília foi transformada em um palco de guerra. Os golpistas que estão acampados em frente aos quartéis, depredaram e incendiaram diversos carros e ônibus, explodiram botijões e tentaram invadir a sede da Polícia Federal. Os policiais reagiram com bombas de efeito moral e balas de borracha — uma ação repressiva bastante comum em protestos de professores, mas raríssima contra os atos criminosos de extrema direita. Apesar da reação, ninguém foi preso em flagrante.

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar

Dizer que os policiais teriam efetuado muitas prisões em flagrante caso os terroristas fossem de esquerda é uma obviedade. Basta lembrarmos das manifestações de 2013, quando Rafael Braga foi condenado a quase 5 anos de prisão por — vejam só que ironia! — violar o Estatuto do Desarmamento. Ele portava na mochila uma garrafa de Pinho Sol e outra de água sanitária, que supostamente seriam usadas para fabricação de coquetel molotov. Trata-se de uma brincadeira de criança se compararmos com o que têm feito os criminosos da extrema direita nos últimos dias. É o famoso Estado Democrático de Direita funcionando normalmente.

Diante das cenas de alto grau de violência, políticos e militantes bolsonaristas praticaram seu esporte favorito: culpar a esquerda. Segundo eles, esquerdistas se infiltraram entre eles para cometer crimes e queimar o filme do bolsonarismo. Mas eles não apresentaram nem um mísero indício que sustentasse a tese. Claro, essa é só mais uma conspiraçãozinha fajuta que agride a lógica e o bom senso, mas que serve para alimentar o gado alucinado.

Bolsonaristas usaram como pretexto para a tentativa de invasão à sede da Polícia Federal a prisão do Cacique Serere, um indígena apoiador de Jair Bolsonaro. A prisão dele foi decretada pelo STF após um pedido da PGR. Serere organizou a invasão à sala de embarque no aeroporto de Brasília e convocou pessoas armadas para tentar impedir a diplomação de Lula. Serere é um criminoso que foi alçado à condição de cacique pelo bolsonarismo, já que a sua comunidade indígena não o reconhece como tal. Serere quase completa a cartela do bingo da picaretagem bolsonarista: é filiado ao partido de extrema direita Patriota, foi candidato a prefeito no interior do Mato Grosso sem apoio da comunidade indígena, é financiado por um fazendeiro bolsonarista, atua como pastor evangélico e já foi preso por tráfico de drogas. Depois de Kelmon, o falso padre, agora o bolsonarismo tem também um cacique fake pra chamar de seu.

Parece que finalmente os bolsonaristas criminosos começarão a ser punidos. Além da prisão do falso cacique, na semana passada o ministro Alexandre de Moraes já havia determinado multa de R$ 100 mil aos proprietários de caminhões identificados nos bloqueios no Mato Grosso. Além da multa salgada, Xandão bloqueou os documentos e proibiu a circulação desses veículos. A investigação revelou ainda que parte desses caminhões já esteve envolvida em crimes como tráfico de drogas, contrabando e crimes ambiental. Esqueça o caminhoneiro tiozão que se informa pelo zap. Estamos falando de uma bandidagem da pesada.

Na última quarta-feira, a bandidagem bolsonarista sofreu um novo revés. Em uma ação engatilhada por Xandão, a Polícia Federal desencadeou a maior operação contra os financiadores dos atos golpistas até agora. Foram cumpridos mais de 100 mandados de busca e apreensão contra os golpistas em diversos estados. Xandão determinou a quebra de sigilo bancário, o bloqueio de contas de dezenas de empresários, a apreensão de passaportes e a suspensão de certificados de registro de CACs. Só em um dos endereços em Santa Catarina foi encontrado um arsenal de guerra: 11 armas, entre elas uma submetralhadora, um fuzil, um rifle com luneta e muita munição.

Não basta punir os autores e financiadores dos crimes. É preciso ir pra cima dos mandantes principais.

Dois deputados bolsonaristas do Espírito Santo, Carlos Von Schilgen (Democracia Cristã) e Capitão Assumção (PL), também foram alvo da operação. Eles são acusados de crime contra a honra, incitação ao crime e tentativa de golpe de estado. Os deputados estão proibidos de sair do estado, usar as redes sociais, dar entrevistas, participar de eventos públicos e devem usar tornozeleiras eletrônicas.

Xandão também quer entender a conivência das autoridades com os criminosos que transformaram Brasília em um cenário de guerra na última segunda-feira. Ele estabeleceu um prazo de 48 horas para que o ministro da Justiça e o governador do DF expliquem quais foram as ações adotadas para conter os terroristas.

Mas é preciso ir além. Há muitas digitais do governo federal presentes na coordenação dos atos violentos. Não se trata apenas de conivência. Em entrevista para a revista Fórum, um servidor da Polícia Federal lotado na Presidência acusa o GSI de coordenar os atos terroristas em Brasília. Sergundo ele, trata-se de um caso de “terrorismo de Estado” que foi planejado pela Inteligência do Planalto. “O GSI está na cabeça disso, e o uso da área do QG, que é militar, é do Exército, não é à toa. (…) O GSI tem hoje poder para controlar mais de mil militares diretamente lá dentro (do QG do Exército e nos acampamentos) e eles estão literalmente bancando, mantendo e abrigando essa gente lá dentro (da área do QG) e logicamente ninguém fardado está aparecendo, porque essa é a forma de operar deles, uma guerra híbrida que alimenta e fomenta tudo que está ocorrendo ali. É explícito para quem está perto que o GSI está incitando isso com esses civis, todo mundo que está por ali (Gabinete da Presidência) sabe disso”, denunciou o servidor. O GSI, comandado pelo General Heleno — aquele que lamentou o fato de Lula não estar doente — nega o conluio com os terroristas.

Desde que ficou sabendo o resultado da eleição, o país assistiu aos terroristas agredindo, ameaçando, sabotando, saqueando, sequestrando e incendiando o país. Faltando apenas 15 dias para a posse de Lula, parece que finalmente a democracia reagiu e começou a enquadrá-los. Mas não basta punir os autores e financiadores dos crimes. É preciso ir pra cima dos mandantes principais. Todos os indícios apontam para Jair Bolsonaro e a cúpula das Forças Armadas. É preciso expurgar o mal pela raiz para que ele não volte a atormentar a democracia nunca mais.

Nem todo mundo pode se dar ao luxo de pagar por notícias neste momento.

E isso está tornando cada vez mais difícil financiar investigações que mudam vidas.

A maioria dos jornais lida com isso limitando o acesso a seus trabalhos mais importantes por meio de assinaturas.

Mas no Intercept Brasil, acreditamos que todos devem ter acesso igual à informação.

Se você puder, há muitos bons motivos para nos apoiar:
1) Nosso objetivo é o impacto: forçamos os ricos e poderosos a respeitar pessoas como você e a respeitar a lei
2) Somos financiados pelos leitores, não por corporações, e somos sem fins lucrativos: cada real vai para nossa missão de jornalismo sem rabo preso, não para pagar dividendos
3) É barato, fácil e seguro e você pode cancelar quando quiser

Escolha fortalecer o jornalismo independente e mantê-lo disponível para todos com uma doação mensal. Obrigado.

FAÇA PARTE

Faça Parte do Intercept

Conteúdo relacionado

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar