O Ministério Público Federal ajuizou uma ação civil pública pedindo que o governo brasileiro suspenda imediatamente o armazenamento e compartilhamento de dados de investigações policiais obtidos por meio do Projeto Excel – e que destrua as bases de dados que estão em seu poder.
Detalhado em uma reportagem do Intercept em março deste ano, o Projeto Excel foi criado em 2020 pela Seopi, a Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça – a mesma responsável por outros projetos de vigilância e pelo dossiê antifascista. Com o Excel, o governo Bolsonaro passou a emprestar ferramentas poderosas de extração de dados de celulares, que incluem mensagens apagadas e dados na nuvem, às polícias estaduais. Em troca, teria acesso aos dados extraídos.
Mas, como mostramos, essa troca de informações é mal regulamentada, e o acesso a dados pode extrapolar os limites da investigação policial. Não há transparência na forma como o Ministério da Justiça acessa os dados, e o projeto mistura as funções de investigação e inteligência.
Em junho, as ONGs Conectas, Data Privacy, Transparência Internacional, Artigo 19 e Fórum Brasileiro de Segurança Pública entraram com uma representação no Ministério Público Federal pedindo investigações sobre o projeto. Agora, o MPF do Distrito Federal entrou com a ação. “Não existe norma no ordenamento jurídico brasileiro que autorize o compartilhamento de dados sujeitos à reserva de jurisdição, obtidos em investigação criminal, para fins de inteligência”, escreveu o procurador regional da República Paulo Coutinho Barreto.
O MPF já havia pedido que o Ministro da Justiça e Segurança Pública adotasse as medidas necessárias para anular a portaria que criou o projeto e os termos de adesão firmados com os estados, assim como a destruição dos dados. O ministério, no entanto, se negou a adotar a recomendação. Dessa vez, pede à Justiça Federal que tome providências para que o armazenamento e recebimento cesse imediatamente e parte do Projeto Excel seja anulado, com as cláusulas que impõem aos estados o compartilhamento dos dados, e que os dados armazenados sejam destruídos. Para Barreto, enquanto o Ministério da Justiça permanecer recebendo o compartilhamento e custodiando dados pessoais sigilosos obtidos por meio Projeto Excel, “haverá violação sistemática e permanente aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, que terão seus dados – sujeitos a reserva de jurisdição – transmitidos para agências de inteligência, à míngua de previsão legal nesse sentido”.
“A ação é um importantíssimo avanço na ideia de separação informacional de poderes. A inteligência não se mistura com segurança pública”, avalia Rafael Zanatta, da Data Privacy. “A ação do MPF é um remédio contra aquilo que chamamos de tecnoautoritarismo no Brasil”.
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