OAB decide que curso de advogada sobre violência obstétrica não é ataque a médicos

Presidente do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, Irene Abramovich acionou OAB contra advogada que informa mulheres sobre direitos no parto.


A Ordem dos Advogados do Brasil decidiu arquivar uma ação movida em março deste ano pela presidente do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, o Cremesp, contra a advogada Letícia Siquelli Monaco por oferecer cursos sobre violência obstétrica. Para Irene Abramovich, as aulas que ensinavam mulheres a se defenderem de violações na gravidez e no parto tinham como objetivo “instigar as mulheres a denunciarem os médicos” e, por isso, a OAB deveria tomar “as providências cabíveis” contra a profissional.

Em resposta a uma nota do Intercept sobre o assunto, o Cremesp afirmou que o uso da expressão violência obstétrica, por si só, seria uma agressão aos médicos, seguindo o entendimento misógino do Conselho Federal de Medicina, o CFM. “O termo é inapropriado e deve ter seu uso abolido, visto que estigmatiza a prática médica e interfere de forma prejudicial na relação médico-paciente”, afirmou o órgão liderado por Abramovich.

Denunciada ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP, Monaco conseguiu o apoio de 1.016 colegas de profissão em um abaixo-assinado em repúdio à ação do Cremesp, anexado como parte de sua defesa. “Obviamente, nós advogadas e advogados temos o dever de defender todas as mulheres”, diz o documento, ressaltando que isso “faz parte do juramento que fazemos quando nos tornamos profissionais do direito”.

A defesa de Monaco lembra que não só a OAB, como a ONU, a Organização Mundial da Saúde e a Organização dos Estados Americanos são unânimes no reconhecimento da violência obstétrica como uma violação de direitos humanos. E frisa então que, enquanto especialista em violência contra a mulher, a advogada tem o dever de “trabalhar de todos os modos para reduzir e erradicar tal prática violenta e repugnante” – um abuso que, na gestão de Jair Bolsonaro, chegou a ser incentivado pelo próprio Ministério da Saúde, como mostrou o Intercept em maio.

“Entendemos como deve ser desagradável um órgão de classe como o Conselho Federal de Medicina e seus Conselhos Regionais assistirem, de tempos em tempos, as condutas muitas vezes criminosas de seus membros e que chocam a sociedade”, prossegue o documento, citando uma resolução do próprio CFM que afirma caber aos conselhos de medicina disciplinar a conduta dos profissionais. Para a defesa, a ação do Cremesp “representa a busca de censura” da advogada “na defesa dos direitos humanos das mulheres”.

Analisando a representação, a Comissão de Ética e Disciplina decidiu por seu arquivamento, considerando que é função do advogado “informar os direitos que a população possui” e que Monaco busca “claramente” fazer isso, não tendo cometido qualquer infração. “Profissionais que incorrem em erros devem, sim, ser investigados por seus respectivos conselhos de classe”, escreveu o assessor da comissão Rubens Capistrano Cacais, destacando que a premissa “se estende aos médicos também”.

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