Luiz Inacio Lula da Silva, Brazil's former president, speaks at a rally during Bahia's Independence Day in Salvador, Bahia state, Brazil, on Saturday, July 2, 2022. Former leftist president Lula still leads the Brazilian presidential race in a potential runoff against incumbent Jair Bolsonaro, a survey carried out between June 20-24 by Futura for Modalmais shows. Photographer: Maira Erlich/Bloomberg via Getty Images

Sim, vocês podem: quem é o homem de Obama na equipe de Lula

Campanha presidencial de Lula vai adaptar estratégia digital usada por Barack Obama para mobilizar voluntários.

Luiz Inacio Lula da Silva, Brazil's former president, speaks at a rally during Bahia's Independence Day in Salvador, Bahia state, Brazil, on Saturday, July 2, 2022. Former leftist president Lula still leads the Brazilian presidential race in a potential runoff against incumbent Jair Bolsonaro, a survey carried out between June 20-24 by Futura for Modalmais shows. Photographer: Maira Erlich/Bloomberg via Getty Images

Eleições 2022

Parte 1


Uma cena chamou a atenção de quem participava do ato que reuniu dezenas de milhares de pessoas em torno do ex-presidente e pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva na última quarta-feira, 3 de agosto, em Teresina, capital do Piauí. Dezenas de pessoas aguardavam em fila para tirar selfies diante de um banner instagramável com a imagem de Lula, devidamente vestido com gibão e chapéu de vaqueiro. Enquanto isso, jovens com pranchetas nas mãos anotavam em folhas de papel o nome, número de WhatsApp, e-mail e CEP de quem esperava a vez.

Era a estreia de uma das ações mais inovadoras planejadas pela equipe de Lula para o começo formal da campanha pela presidência, a partir do dia 16. A ideia é agrupar centenas de milhares de pessoas comuns, sem vínculo partidário, atuação em movimentos sociais ou histórico de participação política, mas que estejam dispostas a ceder parte de seu tempo para ajudar na eleição de Lula.

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Batizada #TimeLula, a campanha é inspirada em iniciativas semelhantes feitas mundo afora, em especial nos Estados Unidos. Antes de chegar ao formato final, a equipe do ex-presidente conversou com responsáveis pelas campanhas de mobilização digital de Gabriel Boric, no Chile, e Gustavo Petro, na Colômbia, além de ativistas do Equador e do México.

Mas não só. Entre os consultados está o americano Ben Brandzel, que se define como escritor, instrutor e ativista internacional na organização de militância digital no campo progressista.

Em 20 anos de atuação na área, Brandzel participou do início do MoveOn, nos EUA, ajudou a fundar a Avaaz.org – ligada à Open Society Foundation, do bilionário húngaro George Soros – e a Online Progressive Engagement Network, ou OPEN, organização que reúne grupos de ativismo digital em 19 países de cinco continentes. Hoje, a OPEN tem braços na Hungria, Nova Zelândia, Polônia, Romênia, Canadá, Israel e França, entre outros, reunindo mais de 20 milhões de colaboradores.

No Brasil, a única organização associada à OPEN é a Nossas, grupo apartidário baseado no Rio e que atua no ativismo digital em várias áreas, como defesa da Amazônia e coleta de agasalhos. No mês passado, a Nossas publicou uma foto da equipe ao lado de Brandzel.

Ele tem se reunido com integrantes da coordenação da campanha de Lula desde fevereiro, e nos últimos meses passou a replicar postagens de Twitter sobre a defesa da Amazônia e da democracia no Brasil de celebridades como os atores Mark Ruffalo e Leonardo DiCaprio.

Brandzel

O estrategista americano Ben Brandzel.

Foto: Reprodução/Higher Ground Labs

Eu tentei conversar com Brandzel sobre sua colaboração com a campanha de Lula, mas ele não respondeu às mensagens que enviei por WhatsApp e pelo Twitter.

O que chamou a atenção da campanha de Lula foi a ligação de Brandzel com o ex-presidente americano Barack Obama. Ele coordenou as arrecadações de fundos para a Organizing for Action, a OFA, uma comunidade criada pelo político democrata, durante a campanha pela reforma do sistema público de saúde entre 2009 e 2010.

A OFA, hoje absorvida pelo Partido Democrata, sucedeu a Organizing for America, que surgiu no rastro da revolucionária campanha presidencial de Obama em 2008. Apontada como a primeira experiência relevante de uso da internet em uma disputa eleitoral, a campanha de Obama usou os instrumentos disponíveis numa época em que as redes sociais ainda não tinham a força e capilaridade de hoje para segmentar eleitores por meio do CEP e mobilizar multidões.

Ao longo daquele ano, o exército de voluntários digitais de Obama saiu da internet para atuar no mundo real em ações – consideradas vitais para a vitória eleitoral do ex-presidente – sobre temas como o incentivo ao comparecimento às urnas ou na disputa com Hillary Clinton nas prévias do Partido Democrata.

Em 36 horas, a mobilização inspirada na estratégia digital de Obama atraiu 7 mil voluntários para a campanha de Lula.

É mais ou menos isso que a campanha de Lula quer fazer, só que atendendo às necessidades e características locais. “Estamos construindo uma política de voluntários brasileira, tropical, feita para o Brasil. Não adianta tentar imitar o que foi feito pelo Boric no Chile”, me disse a coordenadora da campanha digital de Lula, Brunna Rosa.

Ela contou que decidiu lançar um formulário nas plataformas do ex-presidente logo depois do lançamento da chapa Lula-Geraldo Alckmin, em 7 de maio. Ali, as pessoas interessadas em ajudar na campanha podiam enviar dados básicos e escolher entre quatro opções de trabalho voluntário: ações de rua e conversas com indecisos, combate a fake news, coordenação de grupos no WhatsApp ou divulgação das propostas do candidato nas redes.

Em apenas 36 horas, a mobilização atraiu 7 mil inscrições. O sucesso fez acender a luz amarela: a campanha ainda não estava preparada para receber e organizar a multidão de colaboradores. Assim, foi feito um freio de arrumação.


A proposta, antes lateral, foi levada para a coordenação da campanha e ganhou apoio do próprio Lula, que nomeou Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula e um dos amigos mais próximos do ex-presidente, para coordenar a iniciativa. Nos próximos dias, os formulários serão divulgados com força total nas redes do ex-presidente e do PT. A expectativa é que a campanha de voluntários ganhe tração a partir do dia 15.

Um voto por dia

Uma cartilha digital que o Intercept leu em primeira mão abre o leque de formas de participação. Além das quatro opções iniciais, os voluntários também poderão produzir conteúdo próprio, compartilhar material da campanha nas redes e moderar e participar de chats e outras iniciativas online.

Os grupos, divididos por localização geográfica e características de cada voluntário, terão mentores, chamados de “técnicos” (a linguagem emula a do futebol, bem ao gosto de Lula), que vão distribuir as tarefas, conteúdos e dar as linhas políticas estratégicas. Para incentivar ,a participação os “jogadores” vão receber estrelas e “compensações simbólicas”. Por exemplo: compartilhar um card da campanha nas redes vale cinco estrelas; usar camiseta com a foto de Lula na feira conta 10 estrelas; fazer panfletagem, 20 estrelas.

O objetivo, agora, é ganhar votos. “Conquistar um voto por dia é uma grande e nobre missão. A pauta da eleição será cada vez mais frequente no nosso dia a dia. Durante uma conversa no ônibus, no trabalho, na igreja, no bate-papo com os amigos e amigas ou mesmo no almoço de domingo com a família, há oportunidades de atuação e de conquistar mais um voto”, diz a cartilha.

“A ideia é abrir um espaço para as pessoas que querem ajudar na campanha espontaneamente, sem precisar passar pela estrutura burocrática e engessada dos partidos”, me disse Okamotto. “Isso ainda vai obrigar a burocracia partidária a rever suas práticas. Precisamos trazer todo mundo, as pessoas comuns”.

Okamotto e Brunna Rosa garantiram que Ben Brandzel e outros estrangeiros ouvidos no processo de construção do #TimeLula não têm uma relação formal com a campanha. Eles disseram que o ativista norte-americano se ofereceu para ajudar espontaneamente, como pessoa física, sem a participação das organizações das quais faz parte e sem nenhum tipo de contrato ou remuneração financeira.

“O que temos feito já há algum tempo é tentar conhecer as experiências de outros países. O Ben está dentro dessa iniciativa”, afirmou Okamotto.

A área de perguntas e respostas da cartilha digital que pude ler revela que o objetivo da ação vai para além das eleições. “Quando acabar a campanha vou poder seguir ajudando? Sim. Nós vamos precisar de muito barulho nas ruas e nas redes para garantir apoio e aprovação das mudanças e leis necessárias para melhorar a vida do nosso povo. Contamos com você até o final”.

Embora o texto obviamente não cite a possibilidade de derrota de Lula, pessoas que participaram do processo de formulação da campanha dizem que a manutenção de um exército digital para se contrapor a um possível segundo governo de Jair Bolsonaro também está colocada.

O desafio é criar em poucos meses algo que o bolsonarismo construiu ao longo de mais de cinco anos: um exército digital orgânico, capaz de dar apoio no ambiente digital às iniciativas políticas de Lula e do PT.

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