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‘O estado validou meu linchamento’, diz psicóloga presa por ‘tentativa de homicídio’ por ovo atirado em manifestação

Daniela Matheus narra a espiral de violência e arbítrio a que foi submetida por bolsonaristas e a polícia em Curitiba.

‘O estado validou meu linchamento’, diz psicóloga presa por ‘tentativa de homicídio’ por ovo atirado em manifestação

‘O estado validou meu linchamento’, diz psicóloga presa por ‘tentativa de homicídio’ por ovo atirado em manifestação

Foto: Maarten Wouters via Getty Images

“O trajeto de segurança foi traçado por nós com a Polícia Militar. Nós não passaríamos pela Visconde de Guarapuava por já ocorrerem [sic] incidentes nesse mesmo lugar. Mas, conforme a gente seguiu, chegamos perto do Hospital Pequeno Príncipe. Para não incomodar lá, eu corri na frente e pedi para a polícia segurar o trânsito para eu desviar a carreata de mais de 3 mil veículos para a Visconde de Guarapuava”.

O autor da sentença acima é um homem jovem chamado Renato Gasparim, 32 anos, que se apresenta como assessor de políticos e coordenador no Paraná da Marcha da Família Cristã pela Liberdade, um protesto organizado por bolsonaristas após a decisão do Supremo Tribunal Federal que ratificou autorização para estados e municípios proibirem temporariamente cultos religiosos presenciais para conter a pandemia de covid-19.

Gasparim falava numa live transmitida no fim do domingo, 11 de abril, no canal de Facebook da psicóloga Marisa Lobo, personagem que ganhou alguma fama ao ter o registro cassado por oferecer o que chama de “cura gay” (ela acabaria recuperando o direito de clinicar).

Apesar de carregada de mentiras (não havia mais que cem pessoas ali, segundo depoimento de organizadora numa delegacia), a fala contém uma confissão: Gasparim teve ajuda da Polícia Militar do Paraná para driblar o que havia combinado com a própria instituição e dirigiu a sua manifestação para um local de Curitiba em que sabia que poderia haver confusão. Houve, e bastante.

O que se seguiu ganhou manchetes acríticas na imprensa local e nacional. Ao ver uma mulher de 73 anos que caminhava com a marcha desde seu início (ou seja, que havia caminhado até ali cerca de cinco quilômetros, segundo o Google Maps) cair desacordada, os manifestantes se apressaram em acusar um ataque e a buscar um culpado. Havia muitos candidatos: do prédio em frente, voavam objetos leves – de ovos a sacos com água e pedras de gelo – em protesto contra a aglomeração num dia em que a cidade de menos de 2 milhões de habitantes contou 28 mortos e 654 novos casos de covid-19.

Ato contínuo, os manifestantes apontaram para um andar do prédio e, aos gritos, avançaram contra a portaria e exigiram uma atitude dos policiais militares que acompanhavam a marcha. Eles não se fizeram de rogados: exigiram que o síndico os levasse até a porta do apartamento.

Aqui entra em cena Daniela Matheus, 52 anos, psicóloga clínica formada pela Universidade Federal do Paraná, especialista em Saúde Coletiva, Análise do Comportamento e Terapia Familiar. A voz a seguir, em itálico, é a dela, a partir de uma conversa de 45 minutos que teve comigo e a jornalista Ana Paula Carvalho na quinta, 15 de abril.


A gente estava terminando o almoço de domingo. Minha família estava aqui em casa, minha irmã, meus filhos, meus sobrinhos. Estávamos no meio de uma conversa que trouxe um sentimento que era um misto de tristeza e indignação – minha irmã é fisioterapeuta e trabalha em UTIs atendendo doentes de covid-19. Foi quando ouvimos um carro de som na rua.

Fomos todos para a janela olhar. Lá de cima, parecia haver umas 200 pessoas espalhadas pela avenida, no máximo. Logo várias coisas começaram a ser atiradas [para a rua] do prédio onde moro. De repente começou uma gritaria lá embaixo, com manifestantes dizendo que alguém havia sido atingido. Nisso, o carro de som que conduzia a manifestação deu meia volta, e quem tinha o microfone nas mãos passou a comandar gritos de covardes, a dizer que aquilo não ficaria assim. Eu pedi para todos saírem da janela.

Foi quando tocou a campainha do apartamento. Abri a porta e vi o síndico do prédio, acompanhado por três policiais [militares] armados. A polícia me perguntou se eu havia jogado algo pela janela. Fiquei sem saber o que dizer. A sensação era de que não importava o que eu respondesse, eu seria levada [presa]. O síndico estava com uma cara assustada, os policiais me olhavam com um ar muito sério. Respondi que não. Aí o síndico me falou: ‘Daniela, eles [os manifestantes] estão ameaçando invadir, vão invadir o prédio’. Resolvi falar que sim, que havia atirado dois ovos.

Me senti responsável pelo bem-estar do prédio, e tinha medo de ser levada à força dali na frente dos meus filhos, dos meus sobrinhos. A policial – eram ela e dois homens – me disse que eu teria que acompanhá-los. Pedi um minuto, fui ao meu quarto e liguei para um amigo advogado, apavorada. Ouvi dele que deveria esperar, me apresentar depois [na delegacia] e não falar nada para a polícia naquele momento – mas eu já havia falado. Foi quando o síndico entrou para me buscar, dizendo que precisávamos ir, e vi a policial no meio da sala, vindo atrás de mim.

Desci com os policiais. Fomos para a garagem [do prédio, onde uma viatura iria buscá-la]. Lá fora [na rua], as pessoas estavam enlouquecidas, gritando. Nesse momento, meu amigo advogado me ligou, me orientando a não ir [com a polícia], mas a policial me disse que não poderia estar ao telefone e que tinha que entrar na viatura. Meu amigo pediu para falar com a policial, mas ela disse que não falaria com ninguém, que o horário de trabalho dela já havia acabado e que não iria esperar mais nada. Foi quando vi que não tinha alternativa.

A esposa do síndico me trouxe uma colcha para eu me cobrir [no carro]. Eu entrei e me deitei no banco de trás. Mas as janelas da viatura, que estavam fechadas quando ela entrou no prédio, foram todas abertas. Havia gente na porta do prédio, gritando, me chamando de ‘assassina’.

‘O estado validou meu linchamento’, diz psicóloga presa por ‘tentativa de homicídio’ por ovo atirado em manifestação

A aposentada Eva Teresinha dos Santos é atendida por policiais após cair durante manifestação em Curitiba no domingo, 11 de abril.

Foto: Reprodução/Facebook

Os sites e jornais locais que trataram do assunto informam que, segundo a Polícia Militar, a aposentada Eva Teresinha dos Santos, 73 anos, católica praticante, foi atingida por “frutas congeladas arremessadas de um apartamento”. A defesa de Daniela, comandada pelos advogados Juliana Bertholdi, Camila Saldanha Martins e Jonas Augusto de Freitas, é taxativa ao negar que tais objetos tenham saído do apartamento dela.

Um vídeo que ganhou a internet nas horas seguintes ao incidente não permite ver qualquer objeto voando no momento em que Eva Teresinha vai ao chão. Nele, ela caminha trôpega em direção a um homem, como a pedir ajuda. Ao se encostar nele, se vira e cai de costas – como se por força do próprio encontrão. A própria aposentada relatou, em mais de uma entrevista, não saber o que lhe ocorreu, e não relatou até hoje ter sentido um golpe na cabeça.

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Não importa. Gasparim – que no Facebook diz trabalhar para movimentos políticos de direita, defende a posse e o uso de armas e coleciona fotos com o presidente Jair Bolsonaro – já tinha um mártir nas mãos.

Voltamos a Daniela.


Fui levada a uma delegacia de plantão. Um grupo de manifestantes já estava lá, para testemunhar contra mim. Instruída pelo meu amigo que é advogado, disse à delegada que não falaria nada sobre o ocorrido, mas quis contar da minha trajetória profissional – tenho uma vida dedicada a cuidar das pessoas – e que sou uma pessoa de esquerda que mora num prédio onde a maioria [dos moradores] é de direita, o que me faz ‘famosa’ por lá. Falei isso porque estava muito confusa com o fato da polícia ter batido justamente na minha porta. Eu pensava – será que foi algum vizinho [que denunciou]?

Depois o síndico me contaria que, assim que saiu do prédio para ver o que estava acontecendo [na manifestação], as pessoas gritavam que tinha sido ‘a mulher do décimo-terceiro andar’ [que havia atirado o objeto que, segundo eles, causou os ferimentos na idosa]. Mas eu não estava na janela [quando o incidente ocorreu] que estava tomada pelos meus filhos, os meus sobrinhos. Eu já bati panela na janela, já gritei ‘Fora, Bolsonaro’, muitas vezes. Mas dessa vez não estava ali.

Só quando fui liberada e voltei para casa é que conversei com o síndico e a esposa dele, que é a vice-síndica. [Me contaram que] Enquanto ele saiu para ver o que estava acontecendo [no dia do incidente], ela ligou para a empresa que administra o condomínio em busca de ajuda. O advogado da empresa disse que não seria preciso deixar a polícia entrar a menos que eles dissessem exatamente a que apartamento queriam ir. Foi por isso que o síndico cedeu. E ele foi ameaçado pelos manifestantes, muitos sem máscara, que gritavam na cara dele, e por um rapaz chamado Renato Gasparim, que lhe disse que ele teria ‘dez minutos para trazer ela para fora’.

A invasão do prédio pela Polícia Militar é uma atitude no mínimo controversa. A Constituição é clara ao falar da inviolabilidade do domicílio. Faz uma ressalva para casos de flagrante delito, que é questionável no incidente de que tratamos aqui. Até onde se sabe, os policiais nunca disseram ter visto a idosa ser atingida, mas resolveram agir instados pelos manifestantes. Que, como veremos, pensavam nos louros políticos que o acaso lhes colocara ao alcance das mãos.

Daniela foi ouvida pela delegada de polícia Hastrit Greipel. No LinkedIn, Greipel diz que se formou em Direito nas Faculdades Curitiba, formadora de agentes da operação Lava Jato e onde atualmente o ex-juiz Sergio Moro dá aulas. No Facebook, não transparece suas opções políticas. É tida por colegas como pessoa de trato difícil e até mesmo grosseira.

Foi a mesma impressão que Daniela teve a respeito da policial. Talvez porque, antes dela ser ouvida, Greipel já escutara não apenas os policiais militares como também as “testemunhas” do caso: Gasparim, uma fonoaudióloga de 42 anos que o vídeo com Marisa Lobo permite concluir que é próxima dele, e um pastor chamado Carlos Alberto Brasileiro, 44 anos.

‘O estado validou meu linchamento’, diz psicóloga presa por ‘tentativa de homicídio’ por ovo atirado em manifestação

Carlos Alberto Brasileiro (de camisa pólo e boné azul) celebrando o aniversário golpe militar no último dia 31 de março – sem máscara.

Foto: Reprodução/Instagram

Brasileiro é outro que se encaixa no perfil de extremista bolsonarista típico. O perfil no Instagram exibe fotos dele comemorando o aniversário do golpe militar de 1964 (sem máscara), defendendo um novo golpe, tentando fazer do policial baiano Wesley Soares Góes, morto ao aparentemente entrar em surto e atirar contra colegas, um mártir da causa bolsonarista – mais um. Ele também postou um vídeo em que fala sobre o incidente de domingo ao lado de Gasparim.

Segundo reportagem do site da revista piauí, a polícia informou que Gasparim, Brasileiro e a fonoaudióloga Giselle Coléte da Silva “prestaram depoimento voluntariamente” e “disseram ter reconhecido a psicóloga como a pessoa que arremessou as frutas [congeladas]”. Algo que, lembremos, o advogado de Daniela é categórico ao negar.

Foi o que bastou, no entanto, para a delegada Greipel autuar Daniela por tentativa de homicídio doloso qualificado por motivação torpe.

A psicóloga volta a contar a história.


[Após o depoimento] A delegada me ouviu e me mandou esperar fora da sala. Quando fui assinar o termo de depoimento, antes de ser presa, vi que estava sendo autuada por tentativa de homicídio. Fiquei paralisada. Minha vontade foi de sair atrás da delegada e perguntar o que era aquilo. Me senti violentada. Ela havia ouvido dos policiais que eu havia atirado dois ovos. Como isso pode ser suficiente para uma acusação de tentativa de homicídio?

Aquela noite eu passei sozinha na cela [destinada a mulheres]. O tempo todo havia homens chegando presos ao lado. Não preguei um olho, não tive coragem nem de pedir para apagarem a luz, de medo. ‘Se tiver algum bicho andando em mim eu quero ver o que é’, disse a uma policial. Meu coração estava acelerado, bateu mais naquela noite do que em todos os meus 50 anos de vida até agora. Eu estava morrendo de medo de presenciar alguma violência, mas não aconteceu, felizmente. Pelo contrário, todo mundo foi tratado educadamente.

No dia seguinte fui levada a esse outro lugar, que as mulheres [presas] chamavam de ‘carceragem’, onde se espera pela decisão do que será feito conosco. Lá a coisa era mais rígida: tive que tirar o sutiã, fazer agachamento [para revista íntima] antes de ir para a cela. Como tenho curso superior, me colocaram numa cela separada, sozinha – ao lado, havia uma cela com sete mulheres. Esse lugar era horrível, sujo, fedia, havia baratas. Mas as outras presas foram muito parceiras. Me chamaram para conversar quando me assustei com uma barata. Uma delas me perguntou se estava tudo bem e me contou que à noite havia ratos e baratas aos montes ali na minha cela, que era muito suja. Mas disseram: ‘Você não passa a noite aí não, dorme aqui conosco, pedimos para eles [os policiais]’.

Mas não precisei passar outra noite presa. Foi aberta a possibilidade de sair mediante pagamento de fiança de três salários mínimos [cerca de R$ 3,3 mil].

Na live daquele domingo à noite, Marisa Lobo e Gasparim parecem precisar fazer força para demonstrar empatia genuína pela aposentada Eva Teresinha. Os rostos deles transparecem sorrisos e as palavras saem carregadas de ironia e brados políticos. Não à toa: estão excitados com o telefonema que Jair Bolsonaro fizera aos líderes do protesto, transmitido pelo carro de som, e de que falavam até então, e com o alcance extra que o incidente na Visconde de Guarapuava dera à agenda política deles. Quanto a Eva, encaminhada ao hospital, ela recebeu três pontos, um curativo na cabeça e teve alta ainda no domingo.

Lobo também sonha com a política. Em 2020, tentou ser eleita prefeita de Curitiba pelo Avante com uma plataforma que propunha pouco mais que alinhamento canino a Bolsonaro e distribuição de remédios sem eficácia contra a covid-19. Fez pífios 18.547 votos, pouco mais de 2% do total dos válidos.

Num vídeo publicado no Facebook nesta sexta-feira, 16, Eva Teresinha aparece sorrindo na cozinha de casa e com o que aparenta ser um presente nas mãos ao lado de Gasparim e do vereador bolsonarista Éder Borges, do PSD. Nenhum dos três usa máscara. Borges é um sujeito que ganhou fama em 2016 ao perseguir e ameaçar estudantes que ocupavam escolas estaduais, à época como diretor do MBL, e desde então perseguia uma carreira política – conseguiu, finalmente, em 2020. Ele diz ter estado na manifestação e levou o caso à sessão da Câmara Municipal do dia seguinte, onde usou o número do andar do apartamento em que Daniela mora para atacar o Partido dos Trabalhadores.

Sorridente, Eva ouve Borges dizer de sua satisfação em estar ali com ela, um “símbolo da nossa resistência patriótica”. Quando chega a vez dela, a aposentada diz estar feliz e não faz mais que agradecer pelos votos de recuperação que recebeu. Não parece, em momento algum, perceber que está sendo usada numa peça de propaganda política de baixíssimo nível. Ao final, recebe das mãos de Gasparim uma bandeira do Brasil que ela carregava no dia do incidente e está manchada com o que parece ser sangue. “Esse sangue aqui não foi em vão”, ele brada. Ela apenas sorri e agradece.

Borges, incidentalmente, teve o mandato de vereador cassado por ter tido as contas de campanha rejeitadas. A decisão, do Tribunal Regional Eleitoral, saiu em 14 de abril, três dias após a marcha. Cabe recurso. Isso é relevante, para nossa história, por um motivo simples: o advogado que atua para Borges no caso, Alexandre Zeigelboim, apresentou à justiça uma procuração assinada por Eva Teresinha para representá-la no inquérito do incidente. É razoável imaginar que o vereador e Gasparim levaram o documento para ela assinar, junto com o presente, na visita que lhe fizeram.

A promotoria de Crimes Dolosos Contra a Vida do Ministério Público do Paraná deu 90 dias de prazo para que a polícia apure adequadamente o caso ocorrido na avenida Visconde de Guarapuava. Mas um juiz que se debruçou sobre ele, Thiago Flôres Carvalho, já ponderou em decisão citada pela piauí que “não há como, ao menos neste momento, em que se perfaz análise superficial, chegar à conclusão de que a queda não teria se dado pelo arremesso de um objeto, mas de uma colisão entre a vítima e terceiro”.

Daniela retoma a palavra.


A primeira coisa que pensei, quando fui presa, é que teria que me mudar de casa, por ter sido pinçada como a moradora que teria feito aquilo. Mas hoje já não sei. Moro aqui já há muitos anos. Mas hoje sabem meu nome, onde eu moro, expuseram fotos minhas de redes sociais. Me senti e ainda me sinto vulnerável, vítima de uma campanha de ódio. Essa seria a razão mais forte para eu pensar em me mudar.

Tenho tido altos e baixos. Por um lado, me sinto uma pessoa de muita sorte, por ter as pessoas que tenho em volta de mim (ela se emociona e interrompe o relato). Tenho uma rede incrível de amigos, de pessoas próximas. É algo que me emociona. Mas estou triste, foi uma experiência surreal ter sido presa, principalmente por ser presa por essa acusação, a de tentativa de homicídio. Se eu tivesse sido presa por jogar algo da janela, por xingar alguém, vá lá, até pode acontecer – sou uma pessoa que não foge do confronto. Mas saber que tenho essa acusação contra mim, é horrível.

Por outro lado, estou muito indignada. Foi por isso que quis falar com vocês, porque acredito que quando temos a chance de nos posicionarmos, devemos fazer isso. Por sorte tenho condições de pagar um bom advogado, e de morar num prédio. Se eu morasse numa casa, eu teria que sair, não teria tranquilidade para continuar ali. Os manifestantes queriam me linchar. E o estado, pelas mãos dessa delegada, fez a mesma coisa comigo. Com várias coisas caindo do prédio, um tumulto acontecendo, a polícia escolhe uma pessoa para levar [presa], e daí a delegada escreve que cometi uma tentativa de homicídio. Fui presa, esculhambada pessoalmente, profissionalmente. A atitude da polícia ao me levar, e da delegada, ao me atribuir tentativa de homicídio, validou a violência que eu já estava sofrendo.

Marisa Lobo fez uma live com Renato Gasparim pedindo ao Conselho [Regional de Psicologia] que tome providências contra mim. Não tenho nada que desabone minha conduta [profissional], e aí do nada me chamam de ‘assassina de velhinha’. A delegada deu aval para que eu fosse chamada disso. A gente leva anos para construir uma carreira, e aí vem uma devastação. Sinto muita raiva. É tão arbitrário, parece construído. Já vi acontecer com outras pessoas. Dessa vez foi comigo.

Na quarta-feira, 14 de abril, enviei as seguintes perguntas à Polícia Civil do Paraná:

1. Quantos foram, nos últimos 24 meses, os casos similares ao dela que chegaram à Delegacia de Homicídios? (Ou seja, os casos em que pessoas foram retiradas de suas casas e levadas presas por atirarem objetos – nunca armas brancas ou disparos de armas de fogo – em pessoas que passavam defronte a elas)?

2. Desses casos, em quantos se decidiu autuar os suspeitos por tentativa de homicídio doloso qualificado por motivo torpe?

3. A corregedoria será notificada para acompanhar o caso?

A Polícia Militar recebeu as mesmas perguntas e mais uma: por que foi permitido ao protesto liderado por Gasparim desviar do caminho combinado por uma via em que já haviam ocorrido conflitos com moradores?

Ninguém respondeu nada.

 

Atualização: 17 de abril, 12h40.

O texto foi atualizado com o o acréscimo da informação de que Marisa Lobo foi candidata a prefeita de Curitiba em 2020.

 

S.O.S Intercept

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