O governo veio a público comemorar, esta semana, uma queda de 16% no desmatamento da Amazônia. Seria mais ou menos como se Eduardo Cunha convocasse a imprensa para celebrar a diminuição da corrupção. Afinal, desde que surrupiou a presidência, Michel Temer tem feito de tudo para agradar a bancada ruralista – aquele povo que acha que floresta boa é floresta no chão.
Em um ano e meio, o governo editou medida provisória que facilita a grilagem de terras, tentou reduzir áreas de preservação, flertou com a extinção de uma reserva do tamanho da Suíça e congelou o reconhecimento de terras indígenas. E olha que essas foram apenas algumas das maldades com a região amazônica. Ainda assim, o desmatamento diminuiu.
Os ambientalistas só não caíram na gargalhada porque andam assustados demais.
Entre agosto de 2016 e julho de 2017, foram postos abaixo “apenas” 6,6 mil quilômetros, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, afirmou que a redução no chamado “corte raso” teve a ver com ações de “comando e controle”. Para ele, isso prova que “na política ambiental, nós estamos avançando”. Os ambientalistas só não caíram na gargalhada porque andam assustados demais.
Gados em fazenda embargada pelo Ibama por desmatamento no Pará: pecuária é uma das maiores causas de destruição da floresta.
É altamente improvável que o governo tenha colaborado de forma minimamente relevante para a queda no desmatamento. Na verdade, diante de todos os retrocessos, aprovados ou não, seria justo dizer que a redução ocorreu apesar de Temer e seus asseclas.
Para quem entende do assunto, o mais provável é que tenha sido um efeito colateral benéfico da recessão econômica e da queda do preço do gado, que diminui o interesse na pecuária e poupa algumas porções de florestas de virarem pasto. Estudos mostram uma relação histórica entre o crescimento da atividade econômica no campo e a derrubada da floresta:
Fica difícil, portanto aceitar a teoria de “comando e controle” do ministro. Mesmo porque o governo finge que não, mas sabe muito bem que sua presença na Amazônia ainda é mínima, como revelou o chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), general Sérgio Etchegoyen: “Se nós temos 62% do nosso território, que representa a Amazônia, ainda não integrados à vida nacional, isso é um déficit de soberania”, disse numa infame palestra a alunos do Instituto Rio Branco, a que The Intercept Brasil teve acesso.
Felizmente, nesse caso, o déficit foi positivo. O que, diferentemente da comemoração do governo, faz todo sentido. Afinal, em se tratando de gestão Temer, quanto menor a presença do Estado, melhor.
Foto em destaque: Gados na fazenda Nossa Senhora do Carmo em Cumaru do Norte, no interior do Pará, em março de 2017. A fazenda foi embargada em 2008 pelo Ibama. (Eduardo Anizelli/Folhapress)
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