Brazilian President Michel Temer (R) and Finance Minister Henrique Meirelles (L) gesture during the announcement of new measures to stimulate the economy, in the Planalto Palace on December 15, 2016 in Brasilia. / AFP / ANDRESSA ANHOLETE        (Photo credit should read ANDRESSA ANHOLETE/AFP/Getty Images)

A volta do descontrole fiscal: argumento usado no impeachment de Dilma agora pesa contra Temer

Congresso sufocou ministro da Fazenda de Dilma e agora tenta pôr rédeas em Meirelles: quem, afinal, é culpado pela crise financeira?

Brazilian President Michel Temer (R) and Finance Minister Henrique Meirelles (L) gesture during the announcement of new measures to stimulate the economy, in the Planalto Palace on December 15, 2016 in Brasilia. / AFP / ANDRESSA ANHOLETE        (Photo credit should read ANDRESSA ANHOLETE/AFP/Getty Images)

Descontrole fiscal, o argumento que pavimentou o caminho pelo qual Dilma Rousseff foi empurrada do Planalto, está de volta. Henrique Meirelles aparentava cansaço e impaciência na noite desta terça (15), ao anunciar o aumento de R$ 20 bilhões no rombo previsto para as contas públicas deste ano. Não era à toa: a revisão dos cálculos estava prevista para a quinta-feira anterior, dia 10. O atraso de quase uma semana se deu por uma longa negociação com a base política do governo. Coroando a subserviência da equipe econômica ao Congresso, o anúncio foi feito antes disso pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

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Romero Jucá (PMDB-RR) anunciou a nova meta fiscal, ultrapassando o ministro da Fazenda.

Foto: Divulgação/ PMDB Nacional

Aclamado em sua posse como o nome forte do governo, aquele que traria o controle à perturbada economia brasileira, Henrique Meirelles, o “Sr. Estabilidade”, começa a se ver refém do Congresso e a ter sua credibilidade questionada. Para se concretizar, todo o pacote de cortes de gastos anunciado na noite de terça ainda passará pelo crivo dos parlamentares, já que o orçamento da União não deixa de ser uma lei. A armadilha foi a mesma que levou Joaquim Levy, ministro da Fazenda de Dilma, a pedir demissão após um ano de tentativas frustradas em reajustar a economia — eclodindo a crise que levou impeachment.

Desconfiança na meta se reflete em desconfiança sobre Meirelles

O novo cálculo apresentado é colocado sob suspeita, já que exige cortes profundos e receitas extraordinárias. E, mesmo assim, o país deve continuar no vermelho até 2020. Por tudo isso, apesar de parecer um aumento significativo, um rombo R$20 bilhões maior pode ainda estar longe da realidade brasileira. A professora de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Denise Lobato, não descarta uma nova revisão: “A meta é irreal, porque a receita vai continuar caindo. E é provável que mudem novamente, se não a deste ano, a do ano que vem”.

Para o professor de finanças do Ibmec, Gilberto Braga, uma nova revisão não é tão provável porque implicaria em total desestabilidade da equipe econômica e poderia, inclusive, resultar na saída de Meirelles. Ele acredita que o novo limite expandido do rombo fiscal pode ser respeitado, mas apenas com cortes profundos na máquina. No entanto, vê o episódio como um desgaste muito forte entre a equipe econômica e a base política:

“O desgaste foi tão grande nesse episódio que já se fala em fritura de Meirelles. Algo que não estava no radar do mercado passou a constar, que é o questionamento à capacidade da equipe econômica em fazer vencer sua tese. Com esse episódio, lança-se uma dúvida sobre a estabilidade de Meirelles.”

Braga afirma que Meirelles ainda conta com a confiança das instituições financeirasele é emissário delas, afinal —, o que garantiria sua permanência e, consequentemente, a de Temer. Essa seria a diferença entre ambos e a dupla Dilma e Levy.

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O ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pediu demissão após um ano sendo sufocado pelo Congresso.

Foto: Jane de Araújo/Agência Senado

Já Lobato explica que uma das formas de resolver a questão fiscal brasileira passa pela cobrança de dívidas bilionárias que estas mesmas empresas têm com a União. “A saída não agrada a quem está hoje no Congresso porque seria preciso cobrar das instituições financeiras, enfrentar interesses fortíssimos”, critica a especialista. Na realidade, em vez de cobrar, o governo tem perdoado essas dívidas.

O argumento fiscal é apenas a manifestação de um conflito maior, cuja solução não está no orçamento.
Para a professora, a diferença entre a situação de Dilma no fim do mandato e a atual de Temer é que ela não passava a imagem de que iria barrar as investigações sobre parlamentares. Já Temer tem dado sinais claros de repressão aos trabalhos do Ministério Público e da Polícia Federal:

“Na época da Dilma, o legislativo achava que ela não pararia a Lava Jato e passou a usar o argumento fiscal para derrubá-la. Se Temer permanecer na linha de frente das acusações e esse Congresso perceber que as reformas econômicas e as privatizações não passarão, eles vão tirá-lo da mesma forma. O argumento fiscal é um biombo. É apenas a manifestação de um conflito maior, cuja solução não está no orçamento.”

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