O Ministério Público Federal, MPF, pediu uma perícia para avaliar a legalidade do licenciamento do data center que o TikTok e a Casa dos Ventos querem construir em Caucaia, no Ceará. O procurador Alessander Sales ainda garantiu, em entrevista ao Intercept Brasil, que pedirá a paralisação do processo caso a licença de instalação seja emitida antes de sair o resultado da perícia.
Sales está à frente do caso após moradores, indígenas e organizações da sociedade civil pedirem uma ação do MPF para barrar o licenciamento do data center. O procurador se reuniu com representantes do povo Anacé e de entidades na segunda-feira, 27, para discutir o assunto.
“A emissão de uma licença de instalação, como ela vem acompanhada de autorizações para desmatamento, de terraplanagem, tudo isso, tem um potencial de já causar dano. Então o princípio da precaução nos dá a possibilidade de, invocando esse princípio, pedir a paralisação”, disse Sales ao Intercept.
A perícia analisará se o licenciamento simplificado, rito definido pela Superintendência do Meio Ambiente do Ceará, a Semace, foi adequado ao tipo de empreendimento do data center.
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Em agosto, o Intercept revelou que, devido à falta de regras, o data center do TikTok e da Casa dos Ventos em Caucaia foi licenciado como se fosse um parque de vaquejada ou um kartódromo. Enquadrado como de baixo impacto ambiental, o empreendimento também não demandou um estudo ambiental mais aprofundado.
No início da semana, também mostramos que, em um parecer jurídico, última etapa antes da emissão da licença de instalação do projeto, a Semace autorizou uma intervenção – a construção de uma ponte – em área protegida sob a justificativa de que o data center é uma infraestrutura de “utilidade pública”.
Vale ressaltar que, em setembro, a Semace já havia autorizado a supressão de vegetação para uma área de 1.190 metros quadrados.

O procurador Sales disse ao Intercept que ainda aguarda uma estimativa de prazo para a realização da perícia. Caso este tempo seja considerado longo, ele estuda adotar alguma medida mais imediata, como uma recomendação ou ação.
Em uma segunda abordagem, conforme Sales, o MPF analisará o impacto do data center sobre as comunidades tradicionais no entorno do empreendimento, que é o principal objeto da representação protocolada pelos indígenas Anacé junto de organizações da sociedade civil.
O povo Anacé também denunciou que seu direito à consulta livre, prévia e informada, conforme estabelecido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a OIT, da qual o Brasil é signatário, não foi respeitado pela Semace.
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Outras questões apontadas na representação são o uso de água do empreendimento, considerando que já há comunidades no entorno que não têm acesso regular à água, e o consumo de energia.
O Intercept revelou em julho, com base em um documento interno obtido com exclusividade, que o data center do TikTok e da Casa dos Ventos em Caucaia gastará mais energia do que 99,9% dos municípios brasileiros – se a sua demanda for comparada diretamente com o consumo médio por habitante de cada cidade. Se o data center fosse uma cidade, seria a sétima que mais consome energia no Brasil.
Nós procuramos a Semace e enviamos perguntas sobre o licenciamento do data center do TikTok, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.
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