Uma pesquisa do Instituto Sou da Paz divulgada nesta quinta-feira, dia 27, revelou que o número de fuzis apreendidos no Rio de Janeiro subiu 16% e, em São Paulo, 50% entre 2019 e 2022. Já o de pistolas aumentou 32% no Rio e 31% no estado vizinho. O salto tem explicação: as armas de maior potencial ofensivo, antes de uso restrito e controlado, agora podem ser compradas por qualquer civil, com pouco ou nenhum controle – e furtadas ou roubadas com maior facilidade por criminosos.
O cenário é alarmante. Juntos, os dois estados concentram 17% da apreensão de armas de fogo no país e são locais de origem de facções com expressão nacional e internacional. Além disso, segundo o gerente do instituto, Bruno Langeani, a mudança no perfil das armas do crime aumenta o número de vítimas de balas perdidas e dificulta o trabalho da polícia, fortalecendo a “criação de espaços onde a “polícia não entra”, ou só entra com”forças especiais”.
“O caso Roberto Jefferson exemplifica bem qual o problema de liberar armas de guerra para civis”, disse. O ex-deputado aliado de Jair Bolsonaro foi preso com várias armas, entre elas, um fuzil com mira telescópica, e após atirar contra policiais federais foi indiciado por quatro tentativas de homicídio. “Policiais federais foram emboscados e encurralados por um único cidadão, por conta de uma desvantagem tática criada e fomentada pelo governo federal”, criticou.
Desde 2019, ano em que Bolsonaro tomou posse, a potência de armas autorizadas para uso de civis foi ampliada quatro vezes. Com as mudanças impulsionadas pelo presidente, cidadãos agora podem comprar de uma a seis armas de potência até maior que as usadas pelas forças de segurança, sem apresentar justificativas. Armas em calibres antes restritos sempre foram de grande interesse do crime, mas como a venda era permitida apenas ao mercado privado de agentes de segurança, a oportunidade de desvios era menor, assim como a disponibilidade destas armas no mercado ilícito, o que aumentava os preços.
Essas mudanças também preocupam um policial civil de São Paulo que, por estar na ativa, preferiu não se identificar. Para ele, os agentes ficam sem noção do que esperar. “Um colete não adianta nada ou pouco adianta diante de um tiro de fuzil. O policial paulista, por exemplo, ainda não tem noção do que é trocar tiro contra uma arma dessa”. No estado, os policiais civis e militares usam pouco esse tipo de armamento, ao contrário do que acontece no Rio.
No estado, além dos fuzis, há um modelo de arma comumente usado por traficantes, o “kit rajada” – uma adaptação da pistola comum, que se torna capaz de atirar centenas de projéteis por minuto. Ele tem sido visto com mais frequência em outros estados. Uma arma do tipo foi apreendida na região metropolitana de Belo Horizonte, com um homem que dizia carregá-la por desconfiar da namorada, e com mulheres que levavam, do Rio para São Paulo, um carregamento de mais de 50 peças para uso do kit.
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