Homem passa diante de um logo do Google na Conferência Mundial de Inteligência Artificial em Xangai, na China, em 26 de setembro de 2018.

O jornalismo destemido do Intercept só é independente graças aos milhares de leitores que fazem doações mensais. Mas perdemos centenas desses apoiadores este ano.

Nossa missão tem que continuar mesmo depois que o último voto for dado nesta eleição. Para manter nossa redação forte, precisamos de 1.000 novos doadores mensais este mês.

Você nos ajudará a revelar os segredos dos poderosos?

SEJA MEMBRO DO INTERCEPT

O jornalismo destemido do Intercept só é independente graças aos milhares de leitores que fazem doações mensais. Mas perdemos centenas desses apoiadores este ano.

Nossa missão tem que continuar mesmo depois que o último voto for dado nesta eleição. Para manter nossa redação forte, precisamos de 1.000 novos doadores mensais este mês.

Você nos ajudará a revelar os segredos dos poderosos?

SEJA MEMBRO DO INTERCEPT

Projeto secreto chinês do Google estaria praticamente encerrado depois dos conflitos internos

Google usava pesquisas na internet chinesa para testar um mecanismo de busca com censura. A equipe de privacidade da empresa sequer sabia do projeto.

Homem passa diante de um logo do Google na Conferência Mundial de Inteligência Artificial em Xangai, na China, em 26 de setembro de 2018.

O Google foi obrigado a desativar o sistema de análise de dados que estava usando para desenvolver um mecanismo de busca censurado para a China, segundo apurações do Intercept. A atitude da empresa se deu após reclamações internas de empregados da área de privacidade, que alegaram não ter obtido acesso às informações sobre o projeto.

O racha interno sobre o sistema teve enormes desdobramentos e praticamente encerrou o trabalho na ferramenta de pesquisa censurada, conhecida como Dragonfly [“Libélula”], segundo duas fontes que conheciam os planos. O incidente representa um duro golpe para os altos executivos do Google, inclusive para seu CEO, Sundar Pichai, que nos últimos dois anos havia tornado o projeto chinês uma de suas prioridades.

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar

A disputa teve início em meados de agosto, quando o Intercept revelou que empregados do Google que trabalhavam no projeto Dragonfly vinham usando um website com sede em Pequim para desenvolver listas negras para a ferramenta de pesquisa censurada. Ela teria sido programada para bloquear amplas categorias de informação relacionadas a direitos humanos, democracia e protestos pacíficos, em conformidade com as rígidas regras de censura aplicadas pelo governo autoritário do Partido Comunista da China.

O website 265.com, sediado em Pequim, é um serviço de diretório da web – índice de site organizado por categorias, não por palavras-chave – que alega ser “a página mais usada da China”. O Google comprou o site em 2008 de Cai Wensheng, um empreendedor local bilionário. Em língua chinesa, o 265.com oferece aos visitantes atualizações de notícias, informações sobre mercados financeiros, horóscopo e anúncios de promoções de passagens aéreas e diárias de hotel. Ele também inclui uma função de busca que permite pesquisar sites, imagens e vídeos. As buscas inseridas no 265.com, porém, são redirecionadas para o Baidu, a ferramenta de pesquisa mais popular na China e o principal concorrente do Google no país. Como o Intercept noticiou em agosto, aparentemente o Google usou o 265.com como “honeypot” (uma espécie de chamariz) para sua pesquisa de mercado, armazenando informações sobre as pesquisas dos usuários chineses antes de encaminhá-las para o Baidu.

De acordo com duas fontes do Google, os engenheiros que trabalhavam no projeto Dragonfly conseguiram obter grandes conjuntos de dados contendo buscas que os chineses inseriam na ferramenta de pesquisa do 265.com. Pelo menos um dos engenheiros conseguiu uma chave necessária para acessar uma “interface de programação de aplicações” (API na sigla original) associada ao 265.com, e a utilizou para coletar dados de pesquisa do site. Os integrantes da equipe de privacidade do Google, porém, não foram informados sobre o uso do 265.com.

Vários grupos de engenheiros agora foram completamente removidos do projeto Dragonfly e instruídos a desviar suas atenções da China.

Os engenheiros usaram os dados que extraíram do 265.com para descobrir mais sobre o tipo de coisa que os habitantes da China continental costumam procurar em mandarim. Isso os ajudou a criar um protótipo do Dragonfly. Eles usaram as amostras de buscas do 265.com, por exemplo, para analisar listas dos sites que os chineses veriam se digitassem no Google a mesma palavra ou expressão. Eles então empregaram uma ferramenta que chamaram “BeaconTower” [“torre do farol”] para verificar se algum dos sites listados nos resultados de pesquisa do Google seria bloqueado pelo sistema chinês de censura da internet, conhecido como Grande Firewall. Por meio desse processo, os engenheiros compilaram uma lista de milhares de sites banidos, que integraram à plataforma de pesquisa do Dragonfly para que ela eliminasse os links para sites proibidos na China, tais como o da enciclopédia online Wikipédia e o da emissora britânica de notícias BBC.

Pelo protocolo normal da empresa, a análise de buscas feitas pelos usuários está sujeita a sérias restrições e deveria ser avaliada pela área de privacidade, cujo trabalho é proteger os direitos dos usuários. A equipe de privacidade, porém, só soube do acesso aos dados do 265.com depois da revelação feita pelo Intercept, e seus integrantes ficaram “muito irritados”, segundo uma fonte do Google. Os funcionários confrontaram os executivos responsáveis pela gestão do projeto Dragonfly. Na sequência de uma série de discussões, segundo duas fontes, teria sido dito aos engenheiros do Google que eles não estavam mais autorizados a continuar usando os dados do 265.com para ajudar no desenvolvimento do Dragonfly, o que teve consequências graves para o projeto.

“Os dados do 265 eram essenciais para o Dragonfly”, disse uma fonte. “O acesso aos dados agora foi suspenso, o que interrompeu o avanço.”

Nas últimas semanas, as equipes que estão trabalhando no Dragonfly receberam ordens para usar outros conjuntos de dados. Elas não estão mais coletando resultados de buscas da China continental. Em vez disso, agora estão analisando buscas “chinesas globais” inseridas no Google por pessoas que vivem em países como os Estados Unidos e a Malásia. Essas pesquisas são qualitativamente diferentes daquelas originadas de dentro da própria China, o que torna praticamente impossível aprimorar a precisão dos resultados. É significativo que diversos grupos de engenheiros agora tenham sido completamente removidos do projeto Dragonfly, recebido ordens para deixarem de se concentrar na China e trabalharem em projetos relacionados a Índia, Rússia, Oriente Médio e Brasil.

Os registros mostram que o 265.com ainda está hospedado nos servidores do Google, mas seu endereço físico está listado sob o nome de Beijing Guxiang Information and Technology Co., empresa sediada no terceiro andar de um prédio de escritórios no distrito de Haidian, no noroeste de Pequim. O 265.com é operado como subsidiário do Google, mas diferentemente da maior parte dos sites de propriedade da empresa – como o YouTube e o Google.com – não é bloqueado na China e pode ser acessado livremente pelas pessoas no país, usando qualquer navegador de internet padrão.

A disputa interna no Google sobre o acesso aos dados do 265.com não foi o primeiro episódio em que informações importantes relacionadas ao projeto Dragonfly foram ocultadas da área de privacidade da empresa. O Intercept noticiou em novembro que empregados das áreas de privacidade e segurança que trabalhavam no projeto haviam sido deixados de fora de reuniões importantes e sentiam que estavam sendo afastados pelos superiores. Yonatan Zunger, um ex-empregado que passou 14 anos no Google, foi um dos principais engenheiros da empresa, trabalhou no projeto Dragonfly por vários meses durante o ano passado e declarou que o projeto estava cercado de extremo sigilo e era tratado de uma forma “altamente incomum” desde o princípio. Scott Beaumont, líder do Google na China e arquiteto-chave do projeto Dragonfly, “não considerava que as áreas de segurança, privacidade e assessoria jurídica deveriam poder questionar suas decisões de produto”, segundo Zunger, “e mantinha uma relação abertamente conflituosa com elas – bem fora do padrão Google.”

Na semana passada, Pichai, CEO do Google, compareceu ao Congresso dos EUA, onde enfrentou perguntas sobre o Dragonfly. Pichai declarou que “nesse momento” não havia planos para o lançamento da ferramenta de pesquisa, mas se recusou a desconsiderar a possibilidade para o futuro. O Google originalmente pretendia lançar o Dragonfly entre janeiro e abril de 2019. No entanto, os vazamentos sobre o plano e a resistência extraordinária que ele encontrou interna e externamente parecem ter forçado os executivos da companhia a engavetá-lo pelo menos no curto prazo, segundo duas fontes familiarizadas com o projeto.

O Google não respondeu aos pedidos de comentários sobre esta matéria.

Tradução: Deborah Leão

Você sabia que...

O Intercept é quase inteiramente movido por seus leitores?

E quase todo esse financiamento vem de doadores mensais?

Isso nos torna completamente diferentes de todas as outras redações que você conhece. O apoio de pessoas como você nos dá a independência de que precisamos para investigar qualquer pessoa, em qualquer lugar, sem medo e sem rabo preso.

E o resultado? Centenas de investigações importantes que mudam a sociedade e as leis e impedem que abusadores poderosos continuem impunes. Impacto que chama!

O Intercept é pequeno, mas poderoso. No entanto, o número de apoiadores mensais caiu 15% este ano e isso está ameaçando nossa capacidade de fazer o trabalho importante que você espera – como o que você acabou de ler.

Precisamos de 1.000 novos doadores mensais até o final do mês para manter nossa operação sustentável.

Podemos contar com você por R$ 20 por mês?

APOIE O INTERCEPT

Entre em contato

Conteúdo relacionado

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar